Entrevista com
Ativista mundial pela paz
Conversamos com o líder espiritual cuja história se tornou tema do documentário “Amor Radical” e segue inspirando gerações.
25 de Novembro de 2024
Aos 88 anos, Satish Kumar não pretende parar tão cedo. Ele, que foi monge aos 9 anos de idade, hoje é protagonista do documentário “Amor Radical”. Ele não, a sua mensagem - como o próprio gosta de colocar. O filme Original Aquarius, que estreou em outubro nos cinemas e em 15 de novembro na plataforma Aquarius, conta com a produção da Café Royal e marcou presença na 48ª Mostra Internacional de Cinema em São Paulo, evento que este ano teve a Índia como país homenageado.
O filme revela uma abordagem única e inspiradora para a crise socioambiental contemporânea, sem ter como foco os alertas e a gravidade dos problemas, mas sim a mutualidade, diversidade e interdependência que constituem a vida. Seu objetivo é desconstruir determinadas lógicas nocivas como controle, separação e competição.
Satish foi monge jainista na década de 40, participou do movimento Gandhiano e da reforma agrária na Índia na década de 50, atravessou o mundo a pé protestando contra o armamento nuclear durante a Guerra Fria, se mudou para a Inglaterra e lá fundou o Schumacher College, instituição educacional de referência global, voltada à cultura de não violência e à ecologia profunda.
O ativista, que hoje é o protagonista do Plenae Entrevista, é uma demonstração viva do que pode ser alcançado quando a percepção do mundo e as ações cotidianas são preenchidas pelos poderes da simplicidade, integridade, colaboração e amor. Confira a conversa completa a seguir!
Quando eu tinha quatro anos, meu pai morreu e eu assisti toda a cena. Ele não estava falando e nem se movendo, estava deitado no chão e minha mãe e irmãos estavam ao redor, chorando. Essa cena me marcou profundamente. “O que está acontecendo?”, eu perguntei à minha mãe, “por que o pai não está se movendo? Por que o pai não está falando?”. Então minha mãe disse: “Seu pai está morto e ele nunca mais falará, ele nunca mais se moverá, é isso que acontece com quem morre”.
Nessa época, comecei a pensar na finitude de todos ao meu redor, comecei a buscar em minha cabeça de criança uma maneira de impedir que as pessoas morressem. Então perguntei ao meu guru jainista, que também era o guru da minha mãe, se havia uma forma de fazer isso. E ele disse: “Sim. A única maneira de impedir a morte é renunciar ao mundo. Então o ciclo de nascimento e morte, morrer e nascer, morrer e nascer chegará ao fim”. Essa era sua filosofia, a religião jainista.
Na ânsia de garantir que todos viveriam e ninguém mais morreria, encantado por essa ideia, me tornei um monge aos nove anos, praticando a espiritualidade, com uma tigela pedindo esmola, andando descalço e aprendendo sobre religião, sobre amor, sobre sentimentos do coração, todas as coisas boas.
Eu tive um sonho e Mahatma Gandhi apareceu nele. E ele disse: “Quantas pessoas podem se tornar monges? Apenas algumas. Então precisamos praticar espiritualidade no mundo. Caso contrário, a espiritualidade se torna exclusiva apenas para alguns”. E isso me inspirou novamente de forma profunda.
Uma noite, depois da meia-noite, eu escapei, fugi da ordem monástica. Porque uma vez que você se torna um monge jainista, você se torna monge para sempre, por toda a vida. Você não tem permissão para quebrar seu voto. Minha vida começou aos nove anos, saindo de casa, deixando minha mãe, deixando tudo para trás e me tornando um monge e aos 18 anos renunciando a essa escolha em busca de ampliar ainda mais a espiritualidade.
Eu acordava às 4 da manhã e praticava meditação, cantava mantras, depois ia aprender sutras, que são textos religiosos. Por volta das 11 horas, saía com uma tigela para pedir esmola e encontrar comida. Ia de casa em casa, um pouco aqui, um pouco ali, como uma abelha vai de flor em flor pegando um pouco de néctar.
Eu comia apenas uma vez por dia, por volta das 12 horas. Não havia café da manhã, jantar ou chá da tarde, apenas uma refeição por dia. Andava descalço, não podia bicicleta, trem, ônibus, carro, avião, barco, cavalo, camelo, nada, apenas a pé. Essa era a prática. Fiz isso tudo com muito prazer, dos 9 aos 18 anos, foi muito difícil, mas eu não guardei rancor. Eu não reclamei porque esse, na minha cabeça, era o caminho para acabar com a morte.
Não, não acho que farei tudo de novo. Mesmo depois de ser monge, eu não parei de ser monge em espírito. Deixei a ordem monástica, deixei o manto e deixei o tipo de aparência externa de monge. Mas no meu coração, ainda permaneci monge. E é por isso que fiz outra jornada como um monge da Índia para a América. Por dois anos e meio, caminhei por 15 países. 13.000 quilômetros, o que dá cerca de 8.000 milhas.
E caminhei sem dinheiro algum, pedindo comida, sem dinheiro. Andei por 15 países: Paquistão, Afeganistão, Irã. Azerbaijão, Arménia, Geórgia, Rússia, Bielorrússia, Polónia, Alemanha, Bélgica, França, Inglaterra, América, Japão e de volta à Índia. Eu implorei por comida, implorei por roupas, implorei por uma passagem para atravessar o Atlântico, o Pacífico e o Oceano Índico. Então, tudo isso eu implorei. E essa foi uma boa prática como monge. Espiritualidade e paz andam juntas.
Um deles era persuadir o mundo, a humanidade, os políticos, os líderes das quatro capitais nucleares do mundo, Moscou, Paris, Londres, Washington, a renunciar à bomba nuclear. Eu estava pregando paz, não violência. Eu estava dizendo que temos que ter paz em nosso coração, com o mundo, com a natureza.
Uma das histórias mais memoráveis dessa jornada foi quando eu estava caminhando na Geórgia, perto do Mar Negro, e estava dando um folheto explicando o propósito da minha caminhada e por que estou caminhando pela paz e por que não tenho dinheiro. Eu dei esse folheto para duas mulheres que estavam em frente a uma fábrica de chá, elas leram o folheto e então me perguntaram: “Mas realmente você andou todo o caminho da Índia sem dinheiro? Como você come? Onde você consegue sua comida se não tem dinheiro?”.
Eu disse que as pessoas nos dão comida e foi quando elas me perguntaram: “Você está com fome? Então na hora do almoço, trabalhamos em uma fábrica de chá. Tomamos um bom chá, temos uma cantina na fábrica. Você gostaria de tomar um pouco de chá, um pouco de pão e um pouco de comida e nos contar sua história?”, elas disseram.
Elas queriam saber como andei da Índia até a Geórgia e pelo Mar Negro. Então entramos e elas nos deram chá, pão, boa comida. Então, de repente, uma das mulheres teve uma ideia brilhante. Ela saiu da sala e voltou com quatro pacotes de chá e disse que não eram para mim. Então eu fiquei intrigado e perguntei: “Para quem eles são então?”.
Ela respondeu: “Eu quero que você seja meu mensageiro e dê um pacote de chá da paz para nosso primeiro-ministro no Kremlin. O segundo pacote de chá da paz para o presidente da França; O terceiro pacote de chá da paz para o primeiro-ministro da Inglaterra. E um quarto pacote de chá da paz para o presidente dos Estados Unidos da América. E por favor, dê a eles uma mensagem minha: se vocês alguma vez tiverem um pensamento louco de apertar o botão nuclear, por favor, parem por um momento e tomem uma xícara de chá fresco. E convidem seu inimigo para tomar uma xícara também. Então cada xícara de chá será uma xícara de paz, de amor”.
Sim, uma xícara de chá é mais poderosa para resolver problemas do que um tanque. Essa história, eu acho, foi a história mais memorável. E então eu entreguei o pacote de chá da paz no Kremlin, na Casa Branca, e um culpava o outro, quando na realidade não é preciso culpar os outros, a paz se faz unilateralmente.
Meus pacotes de chá ainda não estão sendo compreendidos. Ainda temos guerra em Gaza e na Palestina, guerra em Israel e na Ucrânia. Estamos matando milhares e milhares de pessoas e a humanidade está sendo destruída em nome do ego, em nome de qualquer coisa. É preciso que lembremos da mensagem poderosa do chá.
Sim, claro, quando você está trabalhando dois anos e meio, às vezes você não consegue comida, então ocasionalmente nós não conseguíamos comida, em parte porque havia algumas distâncias nos desertos do Irã, deserto de sal, que não havia vilas. Então nós andamos 50, 60 milhas sem nenhuma vila e tivemos que passar fome.
Ocasionalmente a fome era boa, víamos como uma oportunidade de jejuar. E, às vezes, nós não conseguíamos abrigo e dormíamos sob as estrelas. Eu dizia quem se importa com hotel cinco estrelas quando nós podemos dormir em um hotel sob milhão de estrelas.
Na maioria das vezes, nós éramos cuidados por pessoas que acreditam na paz. Falávamos em escolas, universidades, igrejas, mesquitas e reuniões públicas. Já ficamos em delegacias de polícia, hospitais, em albergues da juventude, em grandes hotéis, em casas pobres, palácios, todo tipo de experiência.
Sim. Acho que a liderança religiosa é um pouco estreita demais. O Papa Francisco eu tive o prazer e a honra de conhecer, fui convidado pelo Vaticano, e acho que no caso dele, ele está tentando trazer uma mensagem política para as pessoas religiosas. Ele quer falar por justiça social, por justiça ambiental, por mudanças climáticas e por paz no mundo. Então ele está sendo uma espécie de mensageiro poderoso de paz, ecologia, meio ambiente e sustentabilidade nesse momento.
Mas, de outra forma, muitos líderes religiosos se veem como funcionários, e eles veem isso mais como um tipo de função para conduzir um serviço na igreja no domingo ou organizar casamento ou organizar funeral ou algo assim. Há um tipo de espiritualidade profunda que está faltando em muitas religiões que se tornaram muito estabelecidas e ricas. Então eu gostaria de ver os líderes religiosos realmente praticando a religião mais do que pregando. No momento, há muito pouca prática de amor e prática de espiritualidade. Tornou-se uma função em vez de uma prática espiritual. Elas precisam de uma revisão e um tipo de mudança mais radical.
Quando Julio Hay me abordou para fazer este documentário, primeiro pensei que não queria me envolver com cinema. Eu sou tímido, pra começar. Além disso, não sabia que tipo de filme seria e que tipo de edição ele faria. Posso confiar nele? Mas então, quando conversamos, vi que ele é um homem muito legal, simpático e empático. De alguma forma, senti uma forte sensação de confiança nele. Achei ele genuíno, sincero, honesto e acredita no que estou falando, na espiritualidade, na ecologia e no amor.
Sendo assim, concordei. E foi uma boa experiência. Ele é um bom cineasta, já estava na Inglaterra por conta de outro filme ele veio para minha casa em Heartland Village para fazer o filme com minha esposa. Ele foi à Índia, na casa de Vandana Shiva, ele e eu fizemos o filme juntos. Ele foi à Rishikesh, Delhi, se esforçou muito, investiu muito tempo e muita energia para fazer o filme.
Quando vi o filme na tela grande, fiquei um pouco envergonhado. Mas então eu pensei que o filme não é sobre mim, é sobre a mensagem - eu sou apenas um mensageiro. Eu não sou importante. Então, com essa humildade, eu aceito o filme. E acho que ele traz uma mensagem de amor radical, de que temos que amar sem nenhuma condição e nenhum julgamento, de forma unilateral, mesmo que não recebamos o amor de volta, é uma aceitação total sem nenhuma expectativa.
O amor vem primeiro. Ame primeiro, depois o resto vem. Porque a verdade pode dividir entre sua verdade ou minha verdade. São 8 bilhões de verdades, mas o amor é um só e ele une. Portanto, o amor deve vir antes da verdade. Eu quero que os jovens aceitem opiniões diferentes e saibam conviver com pontos de vista diferentes mas sempre amando uns aos outros.
Há ainda uma mensagem muito importante de amor radical: ame a si mesmo. Se você não se ama, como vai amar o mundo? Se você não se ama, como as outras pessoas vão te amar? Amando a si mesmo, aceitando a si mesmo, reconhecendo que você é uma pessoa incrível e que cada um de nós é um ser maravilhoso, feitos de imaginação, criatividade, coração, compaixão, amizade e gentileza.
Nós podemos ser artistas, poetas, cantores, dançarinos, fazendeiros, cozinheiros, jardineiros, construtores. Nós podemos fazer coisas incríveis. Então minha mensagem para todos é: se você se ama, então você amará a humanidade sem nenhuma discriminação. O amor é a resposta. Se você ama a natureza, você não a destruirá. Se você ama os oceanos, você não colocará plástico neles. Se você ama os rios, você não colocará esgoto neles. Se você ama as culturas indígenas e seus povos, você não os destrói. Se isso puder ser feito, eu acho que o mundo será um lugar melhor e mais pacífico.
O Plenae Apresenta a história da atriz e cantora Mariana Rios, participante da nona temporada do Podcast Plenae!
29 de Agosto de 2022
Acreditar na força do pensamento é filosofia antiga, milenar. Budistas, por exemplo, sempre pregaram que a sua mente tem mais força do que você imagina. Mas, apesar desse ensinamento ter atravessado séculos, nem todo mundo acredita ou coloca em prática.
Esse, porém, não é o caso de Mariana Rios. Representando o pilar Espírito, a cantora e atriz não se atrela necessariamente a uma religião ao falar da fé que tem em seus pensamentos. Por meio de exemplos práticos, ela relata como conseguiu conquistas coisas que queria, mas que pareciam distantes, apenas acreditando piamente que conseguiria.
Desde pequena, Mariana teve que ser resiliente. Ao perder um irmão pequeno em um trágico acidente doméstico, viu sua mãe sucumbir a uma depressão. Desde então, assumiu para si o papel de “animadora” da família, revelando talvez seus dotes artísticos precocemente sem ninguém perceber.
“Para deixar a minha mãe feliz, eu cantava, dançava e imitava personagens da TV. Cada vez que uma visita falava sobre morte, a minha mãe ficava muito triste e eu entrava em ação. Então, eu subia na mesa e dizia para as pessoas: ‘Agora eu vou me apresentar’”, conta ela.
A alegria que ela desejou transmitir à sua mãe e a força que demonstrava construíram nela uma espécie de personalidade à prova de tempo feio, como ela própria gosta de falar. “Já me disseram que eu joguei a sujeira para debaixo do tapete, como uma forma de encobrir a dor. Eu não vejo assim. Mais de 30 anos depois, ainda dói. A diferença é que eu aprendi a escolher a alegria, não o sofrimento. Eu percebi que o meu estado de espírito impactava as pessoas ao meu redor e por isso eu procurei maneiras de nutrir a positividade”, diz.
De família espírita, Mariana relembra que desde cedo aprendeu que os laços que criamos com as pessoas transcendem esse plano, e que não estamos sozinhos mesmo quando achamos que estamos. “Aprendi que nós vivemos em constante estado de evolução, que essa não é e nem vai ser a nossa única passagem pela Terra. É claro que a compreensão disso tudo veio com o tempo, mas a semente foi plantada lá na infância e germinada conforme eu cresci”.
E foi nessa época que a “mágica” começou a acontecer. Ela desejava ter uma bicicleta ou um microfone que a condição financeira de sua família não podia lhe dar, mas acreditando que conseguiria e fantasiando-se com aquilo na mão, vencia um concurso onde ganhava um deles, por exemplo.
Até mesmo suas grandes conquistas na carreira ela atribui ao fato de ter acreditado que conseguiria e, então, conseguiu. Quando decidiu ser mãe, não foi diferente. Antes mesmo de engravidar, já era capaz de sentir a alegria em estar grávida em todas as suas células.
Durante esse processo, Mariana sonhou com seu irmão pela primeira vez em toda sua vida, em uma viagem profunda e muito emocionante. Ao final do sonho, Mariana teve a certeza de que aquilo havia sido um encontro de almas e que estava grávida.
E estava. Mas era uma gravidez que, em seu íntimo, ela já sabia que duraria pouco. Em um exame de rotina, ela constatou que o coração de seu bebê tinha parado, e por mais triste que ficasse, lembrava do sonho e sabia que tinha que passar por aquela experiência, que era parte do seu destino.
“Cada segundo com aquele serzinho que viveu na minha barriga me fez amadurecer e perceber o amor acontecendo. Ele precisou partir, e eu não me sinto no direito de questionar a decisão de Deus. A única coisa que eu posso fazer é agradecer o presente e deixá-lo ir”, reflete.
Hoje, Mariana segue acreditando que apesar de não termos o controle do que vai nos acontecer, temos o controle de como iremos reagir diante delas, afinal, viver é uma viagem, uma passagem de tempo nesse plano, segundo suas crenças. Sua relação com a fé é plural e profunda, onde ela é capaz de absorver um pouco do que cada religião pode te dar.
“Quando a gente usa o nosso poder do pensar e do sentir para o bem da gente e dos outros, a gente condiciona a mente a estar onde a gente quer. O nosso olhar diante da vida transforma o que desejamos ser. Quando sorrimos, por exemplo, o movimento da bochecha diz ao cérebro que estamos felizes”, conclui.
Defina suas prioridades e acredite com força nos seus sonhos! Somente você é responsável pela realização de cada um deles. Ouça mais desse relato apertando o play por aqui ou na sua plataforma de streaming favorita!
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