Entrevista com

Marília Berzins

Assistente Social

Todo mundo quer viver muito, mas ninguém quer ficar velho

6 de Maio de 2019



Ter consciência de que envelhecemos desde o nascimento é um dos passos para vencer o preconceito etário, segundo a assistente social, especialista em gerontologia e doutora em saúde pública Marília Berzins, presidente do OLHE observatório da longevidade humana e envelhecimento. A visão negativa da velhice é um dos motivos pelos quais os idosos brasileiros são mal cuidados, tanto pelo Estado quanto pela sociedade. 

Em que momento devemos parar para pensar na nossa própria velhice? Nós começamos a envelhecer quando nascemos. Precisamos ter consciência disso desde a pré-escola, não quando estamos com 59 anos e 11 meses. Todo mundo quer viver muito, mas ninguém quer ficar velho. Quando éramos crianças, todo mundo nos perguntava: o que vai ser quando crescer? A pergunta que faço é: o que você vai ser quando ficar velho? A velhice é uma grande conquista humana. Nessa fase da vida, podemos continuar trabalhando e servindo a sociedade. 

Os velhos brasileiros estão sendo bem cuidados?Os velhos brasileiros não estão sendo bem cuidados, sobretudo pelo Estado, que não reconhece que o país já envelheceu e terá cada vez mais idosos e portanto, oferecer políticas públicas que atendam as necessidades deste segmento. O sistema de seguridade social, composto por saúde, assistência e previdência, deveria promover políticas adequadas para atender esse segmento etário. A sociedade também não trata bem os idosos, pois ainda associa velhice com incapacidade, pobreza e dependência. O cuidado sobra para as famílias, que fazem o que podem. 

Quem deve cuidar dos idosos: o Estado ou a família? Em primeiro lugar, é preciso esclarecer que nem todo idoso precisa de cuidado. As pessoas têm medo de envelhecer, porque não querem ficar dependentes. No entanto, pesquisas mostram que 25 a 30% dos velhos necessitam de ajuda de terceiros. Nesses casos, a responsabilidade cabe a um conjunto de atores, a começar pelo Estado, porque envelhecer com dignidade é um direito humano fundamental. Mas a família, a sociedade e o próprio idoso também têm sua responsabilidade no processo do envelhecimento. 

De que maneira o idoso é responsável pelo seu próprio cuidado? A velhice é uma poupança na qual investimos a vida inteira. Bons hábitos são determinantes para envelhecer bem. Se eu sei que a saúde é um fator importante, posso fazer atividade física, ter uma boa alimentação e administrar o estresse. Não preciso esperar a ação do Estado para não comer tudo que tenho vontade no restaurante por quilo. Entretanto, a velhice é uma questão social também. O lugar que definimos que a pessoa idosa terá na sociedade também interferirá na sua velhice. Além disso, gênero, raça, etnia e renda são outros fatores que determinam a velhice. 

Em geral, esposas e filhas assumem a responsabilidade pelo cuidado das pessoas mais velhas da família. Como romper esse padrão e ter uma divisão igualitária entre os gêneros? Na sociedade, quem tem que cuidar do idoso é a família que se personaliza na pessoa da mulher. Pesquisas mostram que as idosas cuidam de seus maridos e mães, mesmo sem ter condição para isso. O cuidado é um princípio de valor humano, tanto de homens quanto de mulheres. A família, a sociedade e o Estado têm de assumir o seu papel e parar de delegá-lo para o sexo feminino. O que está faltando a responsabilização do Estado na oferta de políticas de cuidados. O Estado não está fazendo a sua parte na co-responsabilização dos cuidados, o que tem sobrecarregado muito as famílias que mudaram na sua estrutura. 

Em um contexto social de famílias menores, quem cuida dos velhos? A taxa de fecundidade atual é de 1.7 filho por mulher. As famílias vão ficar velhas e não terão filhos para cuidar delas. Por isso, nossa população precisa desconstruir a ideia da família cuidadora e considerar outras formas de moradia e cuidado. Há uma rejeição às instituições de longa permanência, mas elas podem ser um espaço que proporciona bons cuidados e convivência entre as pessoas. Outras possibilidades são repúblicas para idosos e cohousing. Podemos juntar amigos da mesma faixa etária em um lugar, onde alguém gerencia a limpeza e as compras. O mercado imobiliário já está começando a ficar atento para isso. 

Temos cuidadores suficientes e treinados para os idosos? Nós nem sequer sabemos quantos cuidadores existem no país. Embora a ocupação seja reconhecida pelo Ministério do Trabalho, ela ainda não foi criada como profissão pelo Congresso Nacional. Muitos cuidadores são registrados como empregados domésticos, embora não façam parte dessa categoria. Portanto, não sabemos quantos são. Entretanto, os cuidadores e cuidadoras já são uma realidade no cenário do envelhecimento. Cada vez mais as famílias e instituições precisarão destes profissionais do cuidado. 

Quem são os idosos mais vulneráveis da sociedade? A pessoa que foi excluída socialmente a vida inteira e não teve acesso a renda, moradia e saúde terá uma velhice mais vulnerável e pobre. Trata-se daqueles indivíduos que nasceram e cresceram na linha de pobreza e não puderam contribuir com a previdência. Mas pessoas que tiveram renda ao longo da vida também podem ter uma velhice fragilizada, se não contarem com uma rede de suporte social. Ou seja, a renda é muito importante na velhice, entretanto, relacionamentos sociais e participação social também são fatores que determinam sentido à existência.

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Parada obrigatória

III Simpósio Internacional de Bem-Estar: Cultivando o bem-estar pessoal e social

Confira o que rolou no evento que contou com o apoio do Plenae

20 de Outubro de 2021


No primeiro dia de outubro, o Instituto Einstein promoveu o 3º Simpósio Internacional de Bem-Estar: Cultivando o bem-estar pessoal e social, com a presença de palestrantes nacionais e internacionais de grande renome, como Marcio Atalla,  B. Alan Wallace e Andrew Kemp. Nós estávamos lá como apoiadores e participantes e queremos contar tudo pra vocês!

Na parte da manhã tivemos Elisa Kozasa, nos contando o que a ciência já sabe a respeito do equilíbrio emocional. Entre os estudos, um destaque especial para a ascensão do afetivismo, um movimento que tenta trazer as emoções, os humores, as motivações e sentimentos para dentro do mainstream da ciência. Com ela produzindo evidências cada dia mais robustas sobre como o afeto influencia comportamentos e cognição, poderemos avançar em propostas de intervenções mais assertivas na busca do almejado equilíbrio emocional.

Um estudo, por exemplo, mostrou o impacto das notícias no estado emocional das pessoas e o quanto uma pequena pausa, um relaxamento de 3 minutos, proporcionou uma melhora significativa no estado emocional de todas elas. Aqui você encontra 5 dicas de como fazer pequenas pausas no trabalho sem prejudicar entregas, afazeres e mil reuniões. 

Claudio Lottenberg deu especial ênfase ao papel da espiritualidade na saúde, dizendo que já há estudos que mostram que a espiritualidade tem um efeito importante no desenvolvimento de determinadas regiões do sistema nervoso central. Assim, ele ressaltou a importância de uma integração medicina-espiritualidade, trazendo práticas como a meditação e o desenvolvimento da fé para dentro dos hospitais e clínicas, melhorando a experiência do paciente nestes contextos e, por consequência, a qualidade da prestação de serviços do sistema de saúde. 

Na sequência, a Dra. Dulce Brito, compartilhou sua experiência no desenvolvimento do programa “Ouvid” junto aos profissionais de saúde durante a pandemia. O programa foi um esforço para “ouvir, preparar, apoiar, proteger, cuidar e honrar” estes profissionais que estavam na linha de frente deste momento tão impactante em nossas vidas. Dentre os aprendizados está o entendimento de que somos interdependentes e que o apoio social foi o principal aliado para enfrentar os desafios.

Ela ainda ressaltou a importância das relações e o quanto nos reconhecemos e nos fortalecemos a partir do outro, algo que cada dia mais estudos apontam como a chave para alcançar bem-estar e longevidade, como comentamos nesta matéria. A área da saúde, por ter sido a mais afetada na sobrecarga de trabalho, também foi, consequentemente, a mais afetada emocionalmente.

Ouvimos também o dr. Candido Moreira falando sobre como os algoritmos podem ser utilizados para promover o bem-estar emocional. Segundo os estudos atuais sobre o funcionamento do cérebro, já se sabe que ele utiliza sistemas heurísticos, processos cognitivos que ignoram parte da informação do ambiente, para acelerar a tomada de decisão.

Assim, para nosso cérebro, processos de autorregularão, como rotinas muito controladas ou seguir passos rígidos para não cometer erros, são extremamente cansativos, já que a tendência é simplificar e tomar decisões de maneira mais intuitiva. Neste sentido, a tecnologia, que utiliza algoritmos computacionais e o aprendizado de máquina, tem se mostrado um ótimo aliado para a saúde e já existem uma série de aplicativos com impactos bastante positivos.

Um caminho bastante inovador são os aplicativos do ramo “coachs de saúde”, que dão sugestões, trazem frases motivacionais, fazem recomendações e dão alertas, inclusive para profissionais de saúde, caso o usuário se encontre em situação de risco. 

Para fechar a parte da manhã tivemos a presença internacional de Eve Ekman falando sobre os desafios de cultivar o equilíbrio emocional na vida pessoal e profissional, pontuando o quanto o estresse e as emoções intensas podem influenciar nossos pensamentos e nosso bem-estar.

Ela trouxe o entendimento de que é impossível eliminar os gatilhos que despertam as emoções, assim como não podemos impedir o corpo de sentir tais emoções, mas podemos controlar a resposta que daremos neste processo, na busca de uma reação mais construtiva. Para isso, precisamos de algumas estratégias, dentre elas: nomear as emoções e as sensações corporais em detalhes, aumentar as emoções pró-sociais e praticar a compaixão (com os outros e com nós mesmos, como identificar e aliviar os microestresses do nosso cotidiano, que explicamos em matéria.

Logo na sequência, tivemos o Dr. Edson Amaro, que nos trouxe uma noção do quanto de dados tem sido coletado no contexto da saúde e como eles podem ser utilizados na promoção do bem-estar. Ele citou o exemplo do Biobank no Reino Unido, que possui dados de 117 mil indivíduos e como as análises destes dados podem trazer informações: descritivas do estado atual de uma população; preditivas, mostrando tendências de comportamento; prescritivas, possibilitando orientações e intervenções, e até toda uma gama de descobertas que nem se imaginava.

Além disso, ele mostrou uma série de tecnologias que estão sendo desenvolvidas para coletar ainda mais dados sobre a saúde que vão desde os conhecidos smartwatchs, mas também fraldas inteligentes, vasos sanitários com sensores ou mesmo câmeras que conseguem medir pressão arterial através da cor da pele!

Na sequência o Dr. Andrew Kemp, professor de psicologia na Universidade de Swansea, no País de Gales, falou sobre a complexidade de criar uma teoria de bem-estar, pois ela envolve uma série de elementos que parte desde o indivíduo, passando pela sua comunidade e chegando ao ambiente onde vive. Seus estudos encontraram uma relação importante entre a função do nervo vago e o bem-estar físico e mental, e que tal função é impactada pelo ambiente em que o indivíduo se encontra.

Kemp também falou das práticas de reabilitação de lesões cerebrais adquiridas focadas em bem-estar, propósito e satisfação com a vida, com intervenções especialmente dirigidas a criação de conexão com a natureza como: surf, nadar em rios, jardinagem, entre outras atividades ao ar livre e o quão benéfico este contato com a natureza foi na reabilitação destas pessoas. Nesta matéria, trazemos 5 benefícios do contato com a natureza para a saúde. 

Por fim, B. Allan Wallace nos trouxe reflexões sobre a busca da felicidade. Na visão do budismo e outras escolas do conhecimento, o florescimento humano está dividido em 3 dimensões: a ética (florescimento social e ambiental); o equilíbrio mental (florescimento psicológico) e a sabedoria (florescimento espiritual).

Ele destacou que quanto mais nossa mente está dominada por aflições, hostilidade, ilusões, menos liberdade de escolha temos, portanto precisamos desenvolver a inteligência ética e o autoconhecimento para alcançar a felicidade genuína. Como Eve, ele também trouxe a importância de reconhecer o impulso da emoção antes que se torne um comportamento, para termos o poder de escolher o que queremos expressar ao mundo.

Saímos deste evento com muitos aprendizados e muito felizes em perceber que estamos no caminho certo, abordando o bem-estar nos diferentes pilares que compõem uma vida com qualidade. Cada palestra parecia se encaixar perfeitamente em um dos pilares do Plenae: Corpo, Mente, Espírito, Relações, Contexto e Propósito. Estamos ansiosos pelo próximo evento e esperamos ter te inspirado a participar com a gente nesta jornada em busca de uma vida mais plena. 

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