Entrevista com
Especialista em Gestão de Pessoas
Para a especialista em Gestão de Pessoas, Beatriz Cançado, o gerenciamento de emoções é aprendizado que deve existir desde a infância
4 de Maio de 2021
O que significa gerenciamento de emoções? É uma inteligência passível de ser aprendida? Se sim, quando? Há quantas emoções habitando um mesmo ser humano? Essas e outras perguntas complexas e urgentes na mesma medida foram respondidas por Beatriz Cançado.
A psicóloga é especialista em gestão de pessoas e mestre em psicologia organizacional pela Universidade da Columbia. Ela é também coach de formação pela mesma instituição. Em conversa com o Plenae, ela explica o funcionamento dos nossos sentimentos no cérebro e como aceitá-los e gerenciá-los pode ser a saída para quem busca equilíbrio mental. Confira a seguir.
Para você, qual é o primeiro passo a se dar quando estamos em busca de um maior entendimento das nossas emoções?
Acho interessante voltar alguns passos e dizer que as pessoas valorizam o corpo mais do que a mente por algum motivo inexplicável. Sinto isso na pele, quando eu falo que eu trabalho na área médica, as pessoas me perguntam “você é médica?''. Quando eu digo não, digo que sou psicóloga, é perceptível o desapontamento. Mas por que nós nos tornamos adultos e, muitas vezes, não temos as ferramentas adequadas para lidar com coisas que poderiam ter sido ensinadas na infância? Meu filho tem 3 anos, ele já escova os dentes e toma banho sozinho, se machuca e já sabe por band-aid, mas ele não é treinado para conhecer suas próprias emoções e feridas emocionais que ele e todos nós temos na vida. Então, sou a favor de termos essa conversa muito mais cedo.
Essa conversa opera como uma lição a ser aprendida?
Sim. A boa notícia é que a inteligência emocional é uma habilidade que pode ser aprendida. Nosso Q.E, ou seja, o quociente emocional, pode ser desenvolvido, muitas pesquisas já provaram isso. Nós costumamos achar que somos seres racionais, que nos destacamos no reino animal justamente por isso. Mas nossas primeiras reações são através do sistema límbico, que é o “cérebro reptiliano”, responsável pelo instinto e emoções básicas. Até chegar no neocórtex, região localizada na parte da frente do cérebro e responsável pela racionalidade, a pessoa já sentiu primeiro. Apesar de ser um movimento rápido, ele é secundário. Há ainda outro fator: o cérebro é feito para sobrevivência, então ele é de certa forma preguiçoso, não pode gastar energia para tudo que ele faz e acaba tornando certos movimentos automáticos. E isso acaba também afetando as nossas emoções.
Como esse movimento se dá no cérebro?
Existe uma fala na neurociência que diz “os neurônios que disparam juntos, se conectam”. É assim que criamos hábitos. Imagina um carro que passa sempre no mesmo lugar, ele deixa a marca da roda. É assim também com os neurônios, quanto mais eles conversam entre si, mais eles se aproximam, até que eles se grudam e se tornam automáticos. Como não somos tão treinados a cuidar das nossas emoções, muitas vezes se torna automático uma reação negativa a um evento adverso, isso é aprendido. Exemplo: bater o carro e imediatamente ficar nervoso. Se eu quiser, eu consigo me forçar conscientemente a pensar “que bom que eu estou viva, vou lidar com isso de forma calma”. Você pode até estar mentindo, mas só de falar isso para si mesmo, você já força o seu neurônio a soltar do outro e criar um novo caminho para ele. Nós também temos uma parte no cérebro chamada hipocampo, que é responsável pela parte de resolução de problemas, fundamental para o pensamento inteligente. E aí, quando somos uma pessoa com pensamentos mais negativos e pesados, ele comprovadamente diminui de tamanho. Justamente porque, para sua expansão, é preciso treiná-lo. Se o movimento da reclamação se torna automático, ele não é instigado a aumentar.
Tornar-se mais positivo afeta a comunidade ao meu redor?
Essa é uma das grandes descobertas da última década: o neurônio espelho, também chamado de “célula da empatia”. Ela se espelha no que ela está vendo no outro. Se o meu colega de trabalho é negativo, eu chego lá e só pela expressão facial dele, seu neurônio espelho já dispara e eu ficarei assim também. Não é só uma questão mística de energia pesada, é ciência. Não só temos responsabilidade com nós mesmos de tentar melhorar as nossas emoções, como temos responsabilidade com aqueles ao nosso redor.
Qual seria o primeiro passo para alguém que busca mais inteligência emocional?
A pessoa que busca gerenciar e compreender melhor as suas emoções deve primeiramente identificar quais são os sentimentos que ela possui. Nós pensamos em 10 sentimentos assim de cabeça, sendo que são muitos possíveis, uns 50. A criação da roda das emoções que vem justamente para mostrar esse nível, essas camadas de um mesmo sentimento. Dentro da raiva, temos diversos desmembramentos: ressentimento, fúria, desconfiança, amargura. Não se trata de ser alguém feliz ou triste, mas de estar. E dentro de cada um desses estados, há inúmeros desdobramentos, e é preciso que eles sejam identificados e nomeados. É preciso ainda aceitar os sentimentos ruins, nosso modo automático é fugir, quando na verdade eles precisam ser encarados de frente. A ciência mostra que essa emoção - qualquer uma, na realidade - dura no máximo 90 segundos. Vem a onda e você só precisa esperar passar. Esse exercício é muito valioso: estou sentindo uma sensação ruim e eu vou estar presente durante ela e vou esperar ela passar porque ela também passa. Isso emocionalmente falando, até que ela se torne racional e você começa a racionalizar o porquê dele. Mas o sentimento mesmo, a emoção, dura só 90 segundos. O cérebro também não sabe diferenciar também o que aconteceu agora e no passado. Se eu sofri uma agressão na infância, toda vez que eu penso naquilo, o cérebro desencadeará as mesmas emoções ruins como se fosse naquele momento. A emoção ruim é automática, mas o que eu posso e devo fazer é ressignificar aquela emoção, junto de um psicólogo, um livro, um curso, ou o que funcionar para a pessoa. Essa ressignificação pode ser usada de forma construtiva, como uma releitura mesmo de um estresse que pode te fortalecer, como funciona com os músculos.
E como fazê-lo, afinal?
Existe um conceito que chama o Ciclo de Aprendizagem de Kolb, e ele é composto por quatro etapas: agir, refletir, conceitualizar e aplicar. Não tem ordem, você pode começar de qualquer ponto, mas tem que contemplar os 4. Cada um vai saber como deve ser feito dentro de sua própria realidade, por isso é difícil indicar já direto uma terapia, porque cada um está em um estágio. O importante é estar nessa busca de entender melhor as minhas emoções. Para algumas pessoas é escrever, ou estudar, ou treinar alguma situação desafiadora, ou observar os outros fazendo. É pessoal.
Porque o autoconhecimento é tão importante na prática e no dia a dia?
Você ganha duas coisas: olhando para dentro, eu me torno uma pessoa com mais sucesso profissional, porque sou mais capaz de lidar com situações adversas, sou mais determinado e resiliente. Você também consegue manter relações melhores, e segundo a maior pesquisa já feita na história, pela Universidade de Harvard, a qualidade das relações é crucial para a longevidade. Você também irá compreender melhor que temos várias emoções ao longo de um dia, e isso faz parte da nossa complexidade. Olhando para fora, é aquela questão do neurônio espelho que eu mencionei, eu quero ser para o outro uma pessoa construtiva.
Qual é o lado positivo das emoções negativas?
O mais positivo imediatamente falando é que, se eu sou capaz de aceitar essa emoção negativa, eu já sou uma pessoa mais emocionalmente mais inteligente, e vou ter os benefícios que mencionamos anteriormente. Você também perde o medo, e isso é muito importante para realizar nossos sonhos. Se eu não tenho medo de lidar com emoções ruins, eu posso ser a minha melhor versão e deixo de ser uma pessoa que evita situações desafiadoras. Acredito demais nos pequenos hábitos, o nosso dia a dia é feito disso, de pequenas coisas, e gerenciar melhor nossas emoções é um exercício diário que pode ser aprendido e feito em pequenas doses.
O Plenae Apresenta a história de cura e amor de Marília Costa, representante do pilar Corpo.
6 de Dezembro de 2024
Como ressignificar suas próprias feridas? Cada processo será individual, é claro, e hoje mergulhamos no processo de Marilia Costa, a representante do pilar Corpo na décima oitava temporada do Podcast Plenae. Mais do que superar o câncer de mama precoce, ela ressignificou uma cicatriz que antes representava morte e hoje representa vida.
Foi aos 28 anos, no auge de sua carreira como bailarina, que ela sentiu algo incomum em seus peitos. Por ser jovem, saudável e sem histórico familiar, ela não pensou que de fato pudesse ser algo, mas resolveu investigar depois de uma colega sentir um nódulo rígido na região das mamas. E o laudo do exame não mentia: carcinoma ductal invasivo.
“A gente chegou no consultório e eu lembro que a médica ficou com lágrimas nos olhos quando viu o laudo. Ela disse: “Olha, dar essa notícia pra uma mulher tão jovem é difícil, mas eu preciso te dizer: você está com câncer.” A minha mãe e minha amiga estavam ao meu lado e colocaram a mão em meus ombros. Eu não sei explicar, mas eu não fiquei tão abalada na hora. Eu falei: “Tá bom. O que que eu tenho que fazer agora?”. Eu tive uma força tão grande, que até eu fiquei surpresa, porque não era o meu padrão. Eu era uma pessoa frágil. Eu sou muito magra, a imunidade sempre baixa. E emocionalmente também eu me sentia frágil. Mas naquele momento essa fragilidade desapareceu. E nunca mais voltou”, relembra.
Na cirurgia de remoção, a parte central da mama esquerda, incluindo o mamilo, foi removida. Depois, uma bateria de tratamentos que resultaram em 10 meses de montanha russa “física e emocional”, como a mesma classifica. “Quando eu estava bem, eu estava muito bem. É curioso, mas talvez nesse período eu tenha vivido os dias mais felizes da minha vida. A consciência da finitude me mostrava que aqueles momentos eram muito preciosos”, conta.
Seu medo maior não era nem exatamente de morrer, mas de nunca mais voltar a dançar. Ela lembra que chegou a tentar retornar para um ensaio durante o tratamento e, ainda no aquecimento, já se sentiu muito cansada. Mesmo após o final de todas as sessões de quimioterapia e radioterapia, ela ainda se manteve tomando medicações fortes - e com potencial abortivos - por sete anos e em uma menopausa induzida.
Foi aos 36 anos que, já em um relacionamento, seus sentimentos maternos começaram a aflorar e a possibilidade de engravidar entrou em seu horizonte. Por tudo que tinha passado e submetido o seu organismo, ela sabia que seria difícil gestar, mas isso não era necessariamente um problema - em seus horizontes e leques de possibilidades, a adoção era um caminho possível e bem-vindo.
“Quando o médico me liberou pra começar as tentativas, eu engravidei no primeiro mês! Foi uma surpresa imensa, era um indício que meu organismo estava saudável e pronto para gerar um bebê, parecia inacreditável. E só então eu senti no meu coração o desejo forte de gestar. Pela primeira vez, eu me imaginei com um bebê nos braços”, diz. O que ela não imaginava era que o sonho seria interrompido.
Na oitava semana, Marília soube que a sua gestação era anembrionária, ou seja, quando um óvulo fertilizado se implanta no útero, mas o embrião não se desenvolve. Sem falar que os exames de imagem mostravam a possibilidade de uma gestação molar, que é quando o saco gestacional se transforma em um tumor maligno. O risco de um novo câncer era real - e assustador.
Seis meses depois, uma nova gravidez, um novo aborto, dessa vez uma gravidez química, uma condição em que o óvulo é fecundado, mas o embrião não se implanta no útero. “Eu estava fazendo tudo que estava ao meu alcance. Acompanhamento nutricional pra melhorar a qualidade dos óvulos, meditação, corrida, ioga... E o que estava acontecendo? Era a vida, mais uma vez, me mostrando que eu não tinha controle de nada”, diz.
No mesmo dia em que recebeu a notícia desse aborto, ela se apresentaria como bailarina em seu novo espetáculo solo, chamado “Inquieta Razão”. Nele, ela narrava de forma poética toda sua história com a doença. "Eu estava a caminho do teatro quando eu decidi que aquela seria a última apresentação do solo. Eu não queria mais me envolver emocionalmente e fisicamente com aquela memória. E eu acho que essa foi uma das minhas melhores performances, expressei tudo que estava sentindo, raiva, frustração, medo, angústia e também concebi em cena que o câncer era um capítulo encerrado em minha vida”.
A fertilização in vitro começou a ser sugerida, caminho que para ela, entusiasta da adoção, não fazia sentido. Em um treino de corrida, sentindo um cansaço extremo, ela começou a mentalizar “estou gestando o meu bebê”. E estava. Uma semana depois, mais um teste positivo, mas dessa vez com a sensação diferente, de que era pra valer.
Tainã nasceu saudável e a surpresa maior viria na sequência: mesmo com tudo que tinha enfrentado, ela era capaz de amamentar, não só o seu filho como doar para outras mães também. Suas mamas, que antes representava morte, hoje jorrava vida. Para se emocionar com o resto dessa história, ouça o episódio completo, disponível aqui no site ou no seu Spotify. Aperte o play e inspire-se!
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