Para Inspirar
Inspirados no episódio de Mariana Kupfer, investigamos a maternidade solo opcional no Brasil, seus números e os propósitos dessas mães
7 de Outubro de 2020
Quando se fala em maternidade solo, tristes imagens povoam o nosso imaginário. Isso porque, segundo levantamento do IBGE, mais de 80% das crianças brasileiras têm uma mulher como principal responsável - e 5,5 milhões delas não têm o nome do pai no registro de nascimento. Essa realidade tão difícil e recorrente acomete, sobretudo, as mulheres mais pobres, que não escolheram estarem sozinhas, mas sim, foram abandonadas pelo pai da criança.
Mas e quando a maternidade solo é uma opção pessoal? Como vimos
no episódio da apresentadora Mariana Kupfer
na segunda temporada do Podcast Plenae - Histórias Para Refletir,
a ciência pode ser a principal parceira da mulher nessas circunstâncias, e hoje há diferentes opções de caminhos que ela pode tomar para realizar o sonho da maternidade.
Parte-se do princípio de que instinto pertence a ordem do biológico, portanto, é um impulso interior incontrolável e inconsciente, muito relacionado às necessidades da sua sobrevivência ou da sua espécie. Sendo assim, o instinto materno como verdade absoluta e irrefutável vem sendo contestado em algumas instâncias.
“A maternidade envolve uma série de estruturas como política, economia, cultura. A psicanálise não acredita no instinto materno, mas sim na pulsão, que atravessa o âmbito dos nossos mais íntimos desejos” explica a psicanalista e pesquisadora de comportamento, Luisa Lancellotti. “A gente vai falar que a mãe nasce junto com o bebê, pois sem ele, ela não poderia ser mãe - seja ele adotivo, biológico ou de consideração. Portanto, trata-se de uma construção” diz.
Esse nascimento da mãe se dá antes mesmo do nascimento desse filho. Pela nossa cultura, ela já começa a nascer a partir do resultado positivo do exame, na sexologia e até mesmo na escolha do nome ou no momento de decorar o quarto. “Se eu posso escolher ser mãe, algo me diz que isso passa pelo desejo, então não há um instinto - se não, todas as mulheres gostariam de ser e a gente vê na clínica que isso não é verdade” explica a psicanalista.
E por onde esse desejo interno em ser mãe que algumas mulheres nutrem passa internamente? “Essa questão é infinita, pois a pulsão não tem um objeto fixo, diferente de um instinto. Pode ser por cuidado, pode ser uma questão de reparação da própria infância, diz respeito somente a vida daquela pessoa, portanto, não existe uma resposta fixa. E não cabe a nós debater esse porquê, mas sim entender que ela tem esse direito de decidir.” comenta Luisa.
Sendo assim, o “ser mãe” vai ter um significado próprio, diferente para cada uma. Por isso mesmo, a psicanálise defende que não existe uma mãe ideal, mas sim uma mãe possível. “Esse conceito foi condenado por anos, mas na realidade ele traz liberdade, pois as mães sempre se sentiram muito culpadas por tudo. Além disso, a sociedade não pode dizer o que é bom e o que é ruim, até porque não conhecemos a vida dessa mãe e como ela exerce essa maternagem dela.”
Também amplamente discutido pela psicanálise, as figuras maternas e paternas, diferentemente do que se pensa, não representam pessoas necessariamente, mas sim, funções sociais. A figura materna pode ser exercida pela mãe, por uma avó, por uma enfermeira - e até mesmo por alguém do sexo masculino.
Isso porque essa pessoa é quem investirá o que os estudos psicanalíticos entendem por libido, que é essa energia e cuidado que a espécie humana literalmente necessita para sobreviver nos primeiros anos.
O problema é que o bebê se torna tão dependente dessa conexão que, muitas vezes, se confunde com essa “mãe”. “É muito gostoso fusionar com a mãe, seria ótimo se pudéssemos viver com aquele cuidado incondicional (considerando a perspectiva do bebê) da primeira infância, mas isso é nocivo a longo prazo” explica.
E é aí que entra a figura paterna. “Ela funciona como uma intervenção, uma possibilidade de enxergar outras perspectivas, e pode ser representada por qualquer pessoa, não necessariamente um pai” explica Luisa. Na literatura, essa figura paterna pode ser um chefe ou até mesmo a lei, por exemplo, pois ambos representam essa ruptura e castração.
O importante é que essa criança tenha contato com vários tipos de cuidado, porque isso a fará mais criativa e espontânea. “Em algumas tribos africanas, durante muitos anos, a criança era criada pela tribo inteira. Isso fazia com que ela circulasse esses vários universos e cuidados e se adaptasse melhor” conclui a psicanalista.
Valendo-se do princípio de que a maternidade é um desejo e uma escolha individual de cada mulher, e de que ela é completamente apta a desempenhar essa função sozinha se esse for o seu desejo, quais são os caminhos que ela poderá tomar a partir dessa decisão?
A adoção é, evidentemente, um dos caminhos possíveis para essa mãe. Mas se o seu desejo for a gestação, a reprodução assistida, que muitas vezes é uma opção também de casais - neste caso, que enfrentam alguma dificuldade reprodutiva - pode ser um dos caminhos.
“O primeiro passo é o check-up completo, para analisar a saúde da paciente. O segundo, se for uma reprodução independente, é escolher o sêmem no banco, seja nacional ou internacional” explica o doutor Dani Ejzenberg, ginecologista e obstetra, especializado em reprodução assistida.
Uma vez escolhido o sêmem, ela poderá optar por dois caminhos: a inseminação intra uterina, que é um caminho mais simples e possui uma taxa de sucesso de 12 a 15% por tentativa, ou a fertilização in vitro, que possui uma taxa de sucesso maior, de 50 a 60% - a depender de sua idade ou da sua doadora.
A inseminação é quando o espermatozoide é colocado no corpo dessa mulher para que ele siga de forma natural ao seu óvulo. Já a fertilização in vitro é quando esse processo de fecundação acontece em laboratório e, posteriormente, esse óvulo é colocado dentro da mulher que irá gestá-lo.
“Os tratamentos de reprodução assistida têm um risco muito reduzidos, apesar de não inexistentes. As maiores complicações que elas podem enfrentar são provenientes de suas gestações avançadas, que já poderiam acontecer de qualquer maneira” explica Dani. Isso porque, segundo ele, a maioria das mulheres que procura esse tipo de método, já ultrapassou os 40 anos de idade.
Segundo o doutor, a procura pelos métodos têm aumentado cada vez mais. As mulheres solteiras ainda não são maioria, mas já representam uma parcela significativa delas. “Em geral, são pacientes já estabelecidas profissionalmente, com boa condição social, já passaram dos 35 anos, tiveram relacionamentos não frutíferos e agora se consideram maduras o suficiente para engravidar” explica.
E esse pai costuma fazer muita falta? “Não, pois em geral, as famílias apoiam e são parceiras, que acabam desenvolvendo esse papel. Mais importante do que um pai, é essas mulheres terem uma rede de apoio, pessoas que vão desenvolver papéis importantes na educação dessas crianças”. Se lembra da figura paterna que explicamos? Pois bem.
“A legislação brasileira é uma das mais liberais do mundo, e permite que a pessoa sozinha possa ter filho, tanto homem quanto mulher. Uma pessoa gestar pra outra no Brasil também é permitido, se for feita de forma voluntária e não cobrada, e pode-se adotar sozinho também” diz o doutor. Há diversos caminhos para se ter filhos, mas somente você poderá decidir isso.
Sendo assim, fazemos das palavras de Mariana Kupfer, as nossas. “Mãe não é um estado civil, é um estado de amor”. É uma escolha pessoal e um papel que pode sim ser desempenhado individualmente - quando ele se trata de uma opção. Tem a ver com o seus desejos e propósitos e, ainda assim, toda mãe é ótima dentro de suas capacidades, porque mais importante do que a perfeição, é o amor investido.
Confira os dados a seguir:
- Esses dados abrangem mães solos por opção, por abandono e ainda as viúvas;
- A fertilização in vitro é, dentre as opções médicas, a mais segura em taxa de sucesso;
- O Brasil é um dos nomes mais importantes na prática da fertilização - mas por aqui, ainda é bem caro;
- Fatores culturais e êxito na carreira fazem com que mulheres de todo o mundo adiem o momento da gestação.
Para Inspirar
O “maior amor do mundo” envolve processos complexos do corpo humano e transcende qualquer outro tipo de sentimento
7 de Abril de 2023
O dia das mães é só em maio, mas agora, ainda em abril, fomos investigar um pouco mais sobre o “maior amor do mundo”, também conhecido como o amor materno. Inspirados pelo quinto episódio da décima primeira temporada do Podcast Plenae, onde mergulhamos na linda história de Adriana e Giovanna.
“As mães são muito mistificadas, como se a maternidade fosse um momento sagrado, santificado. (...) Expor a nossa história tem também a função de mostrar que a perfeição não existe. A trajetória de todas as mães e filhos, de todos os pais e filhos terá os seus desafios, independentemente de ter ou não uma condição de saúde”, desabafa Adriana, ao final do episódio.
De fato, a romantização da maternidade é um problema que muitas mulheres vêm se opondo nos últimos tempos. Com o avanço das mídias sociais, mães de todos os cantos do mundo começaram a compartilhar seus relatos reais e, com isso, criaram uma rede onde todas possam se sentir acolhidas em seus medos e angústias.
Em uma pesquisa rápida na rede social Instagram, a hashtag #maternidadereal conta com mais de 10 milhões de adeptos e, ao clicar nela e começar a navegar pelos posts, é comum se deparar com verdadeiros desabafos de mães cansadas ou sentindo culpa. E, como te contamos por aqui, a culpa materna é nociva não só para a mãe, mas também para o filho.
Além da culpa, já falamos sobre quando a maternidade solo é uma opção para algumas mulheres - o que é bem diferente daquelas que são abandonadas pelo pai da criança, sobre parto humanizado, sobre a gestação em idades avançadas, a depressão pós-parto, os aprendizados do “ser mãe”, dentre outros assuntos tão importantes dentro do tema.
Já sabemos que o amor materno é benéfico para o cérebro das duas partes, e também que o ato de maternar libera ocitocina. Nada como a ciência, certo? Pensando nela, fomos atrás de ainda mais fatos sobre essa atividade trabalhosa que deve ser sempre reconhecida, mas não romantizada. Acompanhe a seguir!
O poder do toque
O poder do leite materno é amplamente conhecido, até mesmo por órgãos como o Ministério da Saúde, que o define como uma verdadeira vacina, já que ele ajuda o sistema imunológico e pode até proteger contra o HIV. Mas o que poucos sabem é que um simples toque materno já guarda consigo muitos benefícios.
Pesquisadores da Escola de Enfermagem Dalhousie descobriram que tocar o seu próprio bebê prematuro ou o filho doente pode ajudá-lo a lidar melhor com a dor. De acordo com a pesquisa, essas crianças sentiram 30% menos dor nas injeções, por exemplo, depois de ganharem esse carinho.
Esse abraço de mãe melhora a saúde de um prematuro. A prática apelidada de canguru, que se dá quando a mãe segura o seu filho prematuro perto do seu peito por algumas horas por dia, traz benefícios para a saúde do recém-nascido. Novos estudos, publicados no jornal Pediatrics ou feitos pela Universidade McGill, no Canadá, comprovaram isso.
Os estudos mostram que esse “simples” abraço já ajuda o neném a ganhar peso mais rápido, ser mais resistente a infecções e hipotermia e sentir menos dor durante procedimentos desconfortáveis. Porém, ainda não se sabe como se dá esse mecanismo do contato versus seus benefícios, só se sabe que eles ocorrem quando o bebê está nu e fica diretamente contra a pele nua da mãe (ou do pai).
Professoras de linguagem
Você sabia que aprendeu a falar ainda durante a gestação? E, para isso, bastou ouvir a voz da sua mãe - que não necessariamente precisa ser formada em letras ou nenhum curso do tipo. De acordo com um estudo da Universidade de Washington, os bebês recém-nascidos já sabem diferenciar os sons de sua língua nativa dos ruídos de uma língua estrangeira.
Para chegar a tal conclusão, foram analisados 40 bebês com 30 horas de idade. A partir dessa análise, os cientistas perceberam que os recém-nascidos sugavam suas chupetas com mais força quando ouviam palavras de uma língua diferente da que sua mãe falava quando estavam no útero.
Segundo este artigo, é importante lembrar que um feto começa a ouvir entre a 20º e 24ª semana de gestação, quando os neurônios vão formando o córtex auditivo, a região responsável por processar o som. Então, é a partir desse momento que os bebês podem ouvir os órgãos internos da mãe, assim como sua fala.
Uma outra pesquisa, publicada pela PNAS em 2015, mostrou que os primeiros sons fornecidos pela mãe aos recém-nascidos são os responsáveis pela formação da aptidão auditiva necessária. É ela que molda o cérebro para a audição e desenvolvimento da linguagem desenvolvida no bebê posteriormente.
Há ainda pesquisas comprovando que o bebê se move mais dentro do útero quando a mãe conversa com sua barriga ou apenas a acaricia. Isso sem falar em todo o mecanismo da memória, que também começa a ser desenvolvido ali dentro.
Desde sempre e para sempre
E se o assunto é linguagem, segura essa curiosidade! A figura materna é de tamanha importância que até mesmo os homens da caverna já clamavam pela sua. De acordo com essa pesquisa, da Academia Nacional de Ciências, nossos ancestrais possuíam um vocabulário decente, que incluía palavras do dia a dia e também a palavra “mãe”.
Para chegar a essa conclusão, os pesquisadores usaram um modelo de estatísticas para criar uma árvore genealógica de palavras, disponível neste link para lá de interessante.
You better work!
Na tradução livre, “é melhor você trabalhar”. E é a ciência que está dizendo. Segundo estudos da Universidade de Akron e da Universidade de Penn State, mães que trabalham são mais saudáveis. Os cientistas descobriram que as mulheres que regressam ao trabalho após parirem apresentam mais energia e mobilidade. Além disso, elas também têm menos chance de desenvolverem depressão aos 40 anos.
De dentro para fora
Não se surpreenda com o fato a seguir: um artigo do jornal Pediatrics recomenda que as mães limpem as chupetas de seus filhos colocando o objeto na própria boca. Pode parecer estranho, mas o fato é que essa saliva materna pode proteger os filhos de desenvolverem certas doenças com suas próprias bactérias. No estudo, foi comprovado que os filhos que tiveram sua chupeta limpada pela boca de sua mãe tiveram menores chances de desenvolver eczemas, asma e algumas alergias.
Células por toda a parte
Ainda na linha do “dentro para fora”, a mãe pode ter células do filho no seu próprio cérebro. Isso porque, durante a gestação, a placenta que liga a mãe ao feto e permite que os nutrientes sejam transmitidos ao bebê, é um órgão construído “à quatro mãos”. Nessa placenta, é possível encontrar células de ambos, e elas, é claro, podem migrar através dele, acabando por se multiplicar por anos no corpo do outro.
Por isso, acredita-se que 50% das mães tenham células de seus filhos dentro delas - na maioria das vezes inseridas em sua pele ou em órgãos como pulmões, fígado e rins. O contrário também é verdadeiro: as células de uma mãe também podem acabar em seu filho, mas isso é menos comum. Um estudo publicado no periódico PLOS descobriu ainda que as células de uma criança podem migrar até o cérebro da mãe, e aquelas com mais dessas células têm taxas mais baixas de Alzheimer.
Não é preciso romantizar a maternidade para assumir a sua potência e importância. Nenhum de nós, afinal, chegou aqui nesse plano sem uma mãe como ponte.
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