Para Inspirar
Na décima primeira temporada do Podcast Plenae, ouça os caminhos de superação trilhados por Pedro Pimenta.
20 de Março de 2023
Leia a transcrição completa do episódio abaixo:
[trilha sonora] Pedro Pimenta: Quando eu acordei do coma, eu fui entendendo, mesmo dopado com um monte de remédios, que eu teria que ser amputado. Eu tinha sentimentos mistos sobre isso. Por um lado, eu queria que cortassem logo os meus braços e minhas pernas, pra eu poder ir pra casa. Mas, por outro, eu me agarrava a uma falsa esperança de que aquilo não fosse acontecer, sabe. [trilha sonora] Geyze Diniz: A mudança no corpo de Pedro Pimenta não só o fez sobreviver, mesmo com poucas chances, mas o fez ressignificar e colocar em perspectiva o que de fato é importante. Sua busca pela reabilitação e resgate da autoestima hoje é exemplo para muitas pessoas. Eu sou Geyze Diniz e esse é o Podcast Plenae. Ouça e reconecte-se.
[trilha sonora]
Eu não consegui me divertir naquela festa. Eu fui me deitar e acordei lá pelas 3 da madrugada, com dificuldade até pra me mexer. Logo eu chamei o Lucas. A namorada dele é médica e na época fazia residência em pediatria. Na hora que ela viu as pintinhas roxas nos meus braços e pernas, ela começou a gritar. Disse que a gente precisava ir correndo pro pronto-socorro. Os dois me colocaram no carro e me levaram pro hospital.
[trilha sonora]
Já estava amanhecendo no dia 12 de setembro, quando eu fui transferido de ambulância pra outro hospital, em São Paulo. A essa altura, o meu irmão mais velho, o Daniel, também apareceu. E eu lembro que os três ficaram ali chorando, desesperados. Eu, que já estava com uma confusão mental, não entendi o porquê de tanto desespero. A ambulância seguiu muito rápido, varando os sinais de trânsito e o pessoal estava lá conversando comigo, tentando me manter acordado, mas uma hora eu desmaiei.
Eu acordei em um lugar estranho, com meus braços e pernas enfaixados. Eu senti que eu estava amarrado na cama. Mas, na verdade, eu é que não tinha força para levantar o braço. E se eu tentava erguer um membro, vinha uma força gravitacional que parecia 10 vezes maior que a normal e me puxava pra baixo. Meu tio me explicou que já fazia uma semana que eu estava na UTI.
Eu tinha contraído uma meningite meningocócica muito grave. A meningite é uma doença causada por bactéria, vírus ou fungo. O meu caso, pela gravidade, foi bacteriana, transmitida de pessoa pra pessoa pelas vias aéreas. Eu vinha de um ritmo muito intenso de estudos pro vestibular e estava dormindo muito pouco. O meu sistema imunológico enfraqueceu e a bactéria se instalou. Quando eu entrei no pronto-socorro, eu estava num quadro de choque séptico já, ou seja, de infecção generalizada.
Só o fato de eu ter despertado do coma já foi considerado um milagre. A minha chance de sobrevivência ali era menor que 1%. Eu só fui ter noção da gravidade do meu quadro na minha primeira troca das bandagens dos braços e das pernas. Eu vi meu braço todo preto. Tinha uma parte com o osso já carcomido. E eu acho que ali as drogas que os médicos me davam também tinham o objetivo de me deixar meio zonzo. Eu não estava 100% consciente. E, sinceramente, eu acho que era melhor assim.
[trilha sonora]
Mais ou menos depois de um mês de internação, veio a notícia que eu tanto temia. Eu seria amputado nos dois braços e nas duas pernas. A véspera da operação foi muito esquisita, porque eu tive meio que me despedir da minha família. Eu tinha plena consciência de que a minha chance de sobrevivência ali não era muito alta. E a família toda aquele dia veio me visitar. Tios, primos, estava todo mundo rezando pelo sucesso da operação. Mas o clima era de velório.
[trilha sonora]
A cirurgia correu surpreendentemente bem. Mas o primeiro mês do pós-operatório foi o mais difícil.
[trilha sonora]
Teve as outras incontáveis cirurgias de enxerto, a depressão, o choque identitário de recuperar a consciência ali e perceber que o contorno do meu corpo tinha mudado. As minhas pernas amputadas acima dos joelhos. E os braços, acima dos cotovelos.
[trilha sonora]
A ficha ainda estava caindo, quando o meu irmão me contou que ia ter um show do AC/CD em São Paulo. Eu sou muito fã da banda e estava internado num hospital que, por coincidência, é vizinho ao estádio do Morumbi, local do show. Eu infernizei os médicos e eles me autorizaram a ir. Só que não tinha mais ingresso. Aí a minha família entrou em contato com a organização e implorou pra liberarem a nossa entrada. Deu tudo certo.
Eu entrei no estádio de ambulância e assisti ao show deitado numa maca. A família toda e toda uma equipe do hospital, que o médico fez questão de ter, foram juntos, incluindo até psicóloga. Naquelas duas horas, pela primeira vez em quase 3 meses, eu esqueci do meu problema. Pra muitos foi apenas um show de rock. Mas, pra mim foi o primeiro sinal de que ainda tinha muita vida a ser vivida pela frente.
Eu voltei pro hospital e ainda passei lá o Natal, ano novo e o meu aniversário de 19 anos. Foram cinco meses e meio até a alta. Quando eu finalmente voltei pra casa, o meu pensamento era: “Beleza, resolvi o maior problema que eu tinha, que era não morrer. Mas agora eu tenho um problema gigante pro resto da minha vida. Como é que eu vou viver assim?”. Como eu ia escovar os dentes sozinho? Me trocar? Comer? Fazer as atividades mais básicas do dia a dia. Durante o processo de reabilitação com próteses, eu procurei o máximo de informação possível. Porém o prognóstico dos médicos era de zero independência. Segundo eles, eu teria que usar cadeira de rodas e precisaria de cuidador em tempo integral. Pra sempre. Eu queria usar próteses pra caminhar pô, mas, sem as articulações - joelhos e cotovelos -, os médicos diziam que seria impossível. Segundo eles, se eu conseguisse dar alguns passos com próteses, já seria uma vitória. Então, a gente contratou um cuidador de segunda a sexta no horário comercial, que era o Silvio, e meus irmãos e meus pais se revezam no resto do tempo. Eu não tinha força nem pra me sentar sozinho. Colocaram uma campainha eletrônica ao lado da minha cama. E quando eu acordava, eu tocava essa campainha pro Silvio vir, me colocar de pé, me vestir e me botar numa cadeira. [trilha sonora] A perda de um membro é muito parecida com a perda de um ente querido. Aliás, os passos do luto são os mesmos nos dois casos. Tem a negação, barganha, raiva, depressão e só então a aceitação. Comigo foi igualzinho. No início, quando eu acordava de manhã, eu tinha aquele 1 segundo de paz, antes do mundo colapsar em cima de mim e eu voltar à realidade. Os fins de semana eram ainda mais difíceis. Os meus amigos iam muito lá em casa, mas eles também saíam pra balada, viajavam e chegavam contando aquelas histórias e eu ficava triste por não poder participar desses momentos. Eu alternava dias de bom humor com outros de: “poxa, quem que eu tô tentando enganar? Eu tô aqui tentando me manter feliz o máximo possível, mas a verdade é que eu tô parado e o resto do pessoal tá andando”.
[trilha sonora]
Eu procurei ocupar o tempo estudando produção de música eletrônica no computador. Eu sempre gostei de tocar instrumentos, e essa era uma maneira de continuar conectado à música. Eu estudava umas 8 horas por dia. Também peguei firme na fisioterapia e, três vezes por semana, eu ia pra clínica lá com o Silvio. Rapidinho, eu já conseguia me sentar sem precisar de ajuda. Foi uma baita vitória.
[trilha sonora]
A empresa do vídeo era a mesma do cara que tinha me entregado aquele cartão, o tal do Kevin. Lembra dele? E eu liguei umas três vezes pra ele. Nas duas primeiras, caiu na caixa postal direto. Na terceira, ele atendeu. E por uma dessas coincidências no universo, ele tinha acabado de pousar em Chicago. Nesse mesmo dia, uma sexta-feira, às 10 da noite, ele foi lá no apartamento onde eu estava hospedado. E ele veio e disse: “Na semana que vem, vai ter um campeonato de triathlon pra amputados em San Diego, lá na Califórnia. E esse menino do vídeo vai tá lá. Você pode ir e ver com os seus olhos. Eu tô te dando o caminho das pedras. Se você não for, a escolha é sua”.
[trilha sonora]
O meu irmão não queria ir. Ele tinha medo de eu alimentar falsas esperanças, talvez. Mas mesmo assim eu decidi ir a San Diego. E assim eu conheci o Cameron. Realmente… O cara fazia tudo que tava no vídeo! E com o incentivo dele eu consegui caminhar com as próteses, mesmo sentindo muita dor.
Eu mudei a data da passagem de volta pro Brasil e fui pra clínica de amputados onde o Cameron se reabilitou, em Oklahoma. Era aquela que o Kevin tinha comentado no congresso. Os caras têm um sistema bem radical, baseado em treinamento militar. Tanto é que eles chamavam de bootcamp. Quando a gente passa por uma amputação ou algo assim, é comum que vire o coitadinho da família. Mas lá em Oklahoma não tinha nada disso. Eles eram extremamente duros. Colocavam a gente para descer rampas mesmo sabendo que a gente ia cair. A ideia era aprender a levantar e continuar tentando.
O segredo da minha reabilitação foi o resgate da sensação de pertencimento, de saber que eu não estava sozinho. Até conhecer o Cameron, eu não conseguia caminhar mais do que 20 passos com as próteses. Mas alguma coisa destravou na minha cabeça e eu encontrei uma energia extra dentro de mim. O ser humano é um ser social, ele precisa pertencer a alguma coisa, a algum lugar. Em Oklahoma, eu conheci um monte de gente sem um, dois ou até três membros. Várias pessoas tinham perdido duas pernas, acima dos joelhos também. E eu via que elas estavam em pleno crescimento na vida: nos estudos, no trabalho, no relacionamento… Algumas até tendo filhos. E aí eu percebi: “Opa, peraí. Eu também posso”.
[trilha sonora]
[trilha sonora]
[trilha sonora]
Geyze Diniz: Nossas histórias não acabam por aqui. Confira mais dos nossos conteúdos em plenae.com e em nosso perfil no Instagram @portalplenae.
[trilha sonora]
Para Inspirar
Um câncer de estômago colocou em perspectiva toda sua vida e uma mudança de rota posterior foi necessária.
21 de Novembro de 2022
Leia a transcrição completa do episódio abaixo:
[trilha sonora]
Regina Ramos:
Durante uma fase da minha vida, eu entrei numa pilha de ter sucesso
profissional, trabalhar demais e só correr atrás de dinheiro. Eu buscava a
felicidade fora de mim e, sem perceber, fui me afastando da minha essência. Eu
precisei adoecer gravemente para me reencontrar. Eu coloquei a vida nos trilhos
novamente e, hoje, ajudo as pessoas a encontrarem a felicidade dentro de si
mesmas.
Ouça no final do
episódio as reflexões do historiador Leandro Karnal para te ajudar a se
conectar com a história e com você mesmo. Eu sou Geyze Diniz e esse é o Podcast
Plenae. Ouça e reconecte-se.
O câncer é uma doença
multifatorial, ele é ligado à genética, ao ambiente e aos hábitos, por exemplo.
Mas eu acredito que a doença também pode estar relacionada a dificuldades em
você lidar com o estresse e com as emoções. Eu observava isso no HC. Todos os
meus pacientes, ao sentirem a iminência da morte, refletiam sobre as suas
vidas. Eram pessoas em estado de muito sofrimento psíquico e com histórias de
vida pelas quais eu tinha muito carinho, cuidado e respeito.
Quando eu fiz a minha
retrospectiva biográfica, eu estava com 42 anos. A partir dessa idade, segundo
a teoria da biografia humana, o plano espiritual começa a se tornar mais
importante que o físico. E aí eu percebi que tinha alguma coisa fora do eixo.
Eu estava mais materialista do que nunca. No fundo, eu sabia que eu precisava
corrigir a rota. Mesmo assim, eu liguei o piloto automático e segui na minha
rotina de executiva de RH. Continuei depositando a minha felicidade no sucesso
profissional e financeiro.
No dia seguinte à
consulta, fui à igreja Nossa Senhora de Fátima, sentei no primeiro banco e
supliquei: “Nossa Senhora de Fátima, eu preciso da sua ajuda. Eu entrego a minha
vida nas suas mãos”. Na véspera da operação, eu tive uma sessão com a minha
psicóloga e perguntei pra ela: “Márcia, e se não der certo?”. Tipo assim: se eu
morrer amanhã? Ela, muito carinhosamente, com o olhar fixo me respondeu: “Tem
coisas na nossa vida que estão acima de nós!”.
Eu entendi a minha
limitação e aí, eu fui aprendendo o meu lugar em relação a Deus. Na véspera da
cirurgia, eu rezei com os meus filhos, de 9 e 6 anos, antes de dormir. A gente
fazia aquele ritual sempre, mas aquela oração foi muito forte e especial para mim
porque, ao final, eles disseram: “Papai do céu proteja a nossa mamãe amanhã”.
Neste mesmo dia, ao
final da tarde, eu estava preocupada com o André, pois sabia que me operaria e
que seria um desafio por eu ser sua amiga. Queria falar alguma coisa para ele e
não sabia o quê. Foi então que fui a uma papelaria comprar uns cartões pois eu
queria escrever alguma coisa pra minha família, pros meus filhos e pros meus
amigos.
Quando cheguei no
caixa para pagar, tinha um livrinho desses pequenos, e ao abrir estava escrito
um diálogo entre um médico e Deus. O médico perguntava: “Deus, o que eu faço
para salvar minha paciente?”. E Deus respondeu: “Você faz a parte do médico e
eu faço a parte de Deus”. Foi isso que eu falei para ele no centro cirúrgico e
pra minha felicidade, todo mundo fez a sua parte.
Em nenhum momento eu
me vitimizei. A minha grande pergunta interna não era “por que” isso aconteceu
comigo, mas sim “para que” estou passando por isso. Qual aprendizado que eu
devo tirar dessa experiência? Afinal, sem querer, eu tinha mudado de lado: eu
passei de psicóloga a paciente. Comecei a perceber que, quanto mais eu buscava
meu autoconhecimento, mais eu tinha clareza nas respostas. As explicações
estavam dentro de mim e não fora. Eu me dei conta que tudo isto que estava
acontecendo era para me ajudar a colocar em ordem tudo aquilo que estava em
desordem. O que parecia o fim, foi só o começo.
Eu diminuí o ritmo de
trabalho e me tornei pesquisadora junto a uma equipe de médicos antroposóficos
na Escola Paulista de Medicina. Há 13 anos, eu estudo a teoria da Salutogênese.
“Salus” quer dizer saúde, e gênese origem, ou seja, como encontrar dentro de
nós as forças que nos blindam diante do estresse para que não cheguemos a
adoecer.
Essa abordagem foi
criada por um sociólogo chamado Aaron Antonovsky. Ele pesquisou o que havia em
comum entre os sobreviventes do Holocausto que se adaptaram às mudanças, reconstruíram as suas vidas e não adoeceram.
Ele constatou que essas pessoas não se colocavam na posição de vítima e tinham
um olhar positivo para a vida, mesmo passando por adversidades. Elas tinham
também internamente o que ele denominou “senso de coerência”: um equilíbrio
psíquico entre o que pensavam, sentiam e como agiam. Mas, o mais importante,
ele ressaltou, é que elas sempre encontravam um sentido maior no sofrimento, um
significado para poder continuar adiante.
[trilha sonora]
O segredo é a gente
ter flexibilidade e não ficar nos extremos, nem ser totalmente vulnerável nem
se achar a Mulher Maravilha ou o Super-Homem, que enfrenta tudo que aparece.
Com o autoconhecimento, a gente conhece os nossos limites e sabe até onde
podemos ir. O conceito de resiliência que eu acho legal é passar pela situação
difícil e sair mais fortalecido dela. É como um músculo que você trabalha na
academia, só que um músculo emocional, que você sempre pode fortalecê-lo.
Quando eu dou uma
aula, palestra ou um treinamento, eu compartilho o meu exemplo. O pessoal se
espanta de saber que eu vivo bem sem um estômago. Eu sempre digo para eles uma
frase de uma meditação: “Nada terá valor se a coragem nos faltar”.
Com o trabalho
biográfico, eu ajudo as pessoas a encontrarem a resiliência na sua própria
história de vida e a entenderem que essa força interna aparece nos momentos
mais difíceis. Quando a gente se apropria dela, temos mais habilidades para
enfrentar os problemas que possam surgir. Descobrir essa força interna que cada
um de nós tem e muitas vezes não percebe é o caminho para viver com saúde.
Ela precisou ter um
grave caso de câncer de estômago, fazer uma cirurgia delicadíssima que obriga a
uma reeducação absoluta depois da cirurgia pra que ela pudesse acordar para
outros valores que ela já tinha, mas que agora terá um outro olhar, e vai parar
de pensar que a vida é feita exclusivamente do sucesso e da aplicação do
sucesso profissional.
A Regina foi
descobrindo como paciente o que talvez ela dissesse para seus outros pacientes:
que ela de fato tinha que reinventar propósitos, tinha que reinventar na mente seus valores, tinha que redefinir metas, que
não podia ficar apenas focada em um campo. E foi redescobrir-se
profissionalmente, foi revalorizar coisas da família, passou a desenvolver
muito esse conceito de resiliência e conseguiu redefinir as coisas a partir de
uma experiência impactante que é o câncer no estômago. Muitas vezes, a
dificuldade tem esse poder de epifania, de revelação de quem nós somos de
verdade, que é o que aconteceu com a Regina.
Geyze Diniz:
Nossas histórias não acabam por aqui. Confira mais dos nossos conteúdos em
plenae.com e em nosso perfil no Instagram @portalplenae.
Conteúdos
Vale o mergulho Crônicas Plenae Começe Hoje Plenae Indica Entrevistas Parcerias Drops Aprova EventosGrau Plenae
Para empresas