Para Inspirar
Inspire-se com o episódio de Corpo da décima oitava temporada do Podcast Plenae - Histórias para Refletir!
1 de Dezembro de 2024
Geyze Diniz: Foi durante um ensaio que a bailarina Marília Costa sentiu que havia algo estranho com seu corpo. Aos 28 anos foi diagnosticada com câncer de mama e iniciou o tratamento. Anos mais tarde, após ter dois abortos, nasceu seu filho Tainã. E seu peito que antes representava doença, passou a significar vida. Eu sou Geyze Diniz e esse é o podcast Plenae. Ouça e reconecte-se.
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Fiz uma bateria de exames e, quando o resultado da biópsia saiu, eu fui direto para o consultório da mastologista. No caminho, eu pedi para minha amiga ler o laudo do exame, enquanto eu dirigia. Ela leu: “Carcinoma ductal invasivo”. Eu não entendi aquelas palavras, então eu falei pra ela: “Ah, beleza não é câncer não, né?”. E ela respondeu: “Não, não, não é. Relaxa”. Mas ela sabia que era.
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A gente chegou no consultório e eu lembro que a médica ficou com lágrimas nos olhos quando viu o laudo. Ela disse: “Olha, dar essa notícia pra uma mulher tão jovem é difícil, mas eu preciso te dizer: você está com câncer.” A minha mãe e minha amiga estavam ao meu lado e colocaram a mão em meus ombros.
Eu não sei explicar, mas eu não fiquei tão abalada na hora. Eu falei: “Tá bom. O que que eu tenho que fazer agora?”. Eu tive uma força tão grande, que até eu fiquei surpresa, porque não era o meu padrão. Eu era uma pessoa frágil. Eu sou muito magra, a imunidade sempre baixa. E emocionalmente também eu me sentia frágil. Mas naquele momento essa fragilidade desapareceu. E nunca mais voltou.
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Eu entrei no centro cirúrgico sem saber direito o que ia acontecer, porque durante a cirurgia os médicos iriam investigar um segundo nódulo, que poderia ser maligno. Quando eu acordei, soube que tinham removido a parte central da mama esquerda, incluindo o mamilo. Não vou dizer que foi uma operação tranquila, mas foi menos invasiva do que poderia ter sido.
Pouco tempo depois, eu comecei a quimioterapia. Foram quatro sessões da quimio mais forte, aquela que faz o cabelo cair e que efeitos colaterais fortes. Depois mais 12 de uma quimio mais branda. E, para terminar, eu fiz 30 sessões diárias de radioterapia. No total, foram 10 meses vivendo uma montanha russa física e emocional. Quando eu estava bem, eu estava muito bem. É curioso, mas talvez nesse período eu tenha vivido os dias mais felizes da minha vida. A consciência da finitude me mostrava que aqueles momentos eram muito preciosos.
Então, eu aproveitava para ir ao parque, assistir espetáculos, viajar. Eu cheguei a pegar um avião de São Paulo à Vitória, no Espírito Santo, para visitar uma grande amiga. Era um tipo de aventura que eu nunca tinha feito antes. Nos dias bons, eu me sentia radiante. Nem a careca era um peso para mim. Eu já tinha sentido vontade de raspar a cabeça antes da doença, então eu tirei de letra. Às vezes eu colocava um lenço, mas só pra fazer um estilo ou pra me proteger do frio ou do sol.
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Só que nem sempre eu estava bem. Quando eu acordava mal fisicamente, eu entendia que aquele mal-estar também ia me deixar pra baixo emocionalmente. Nesses dias, eu me permitia sentir tristeza, angústia, medo. Como eu tenho uma consciência corporal muito presente, eu sentia todo o meu corpo recebendo e digerindo aquelas medicações.
A quimioterapia mata não só as células doentes, as saudáveis também. Eu entendia que aquela tristeza era um dos efeitos colaterais. Eu tinha saído da minha melhor forma física para um corpo com 10 quilos a mais. Foram intensas as transformações, externas e internas. Nada mais era como antes.
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Eu não tinha medo de morrer. Eu tinha medo de não conseguir dançar mais. Durante o tratamento, eu até tentei voltar pra companhia, mas foi impossível. Eu fui em um ensaio, e com 30 minutos de aquecimento já me dei conta que eu não tinha condições físicas. Quando o tratamento terminou, eu fiquei em uma menopausa induzida e iniciei o tratamento preventivo. Por sete anos eu tomei o comprimido diariamente. Com ele, eu não podia engravidar de jeito nenhum, porque o remédio pode causar aborto espontâneo, defeito congênito e até morte fetal.
Eu parei esse medicamento aos 36 anos. A essa altura, eu estava em um relacionamento e decidimos perguntar ao meu médico se eu podia engravidar. Ele disse que sim, mas pediu uma série de exames pra gente ter certeza que não havia nenhum foco da doença. Foi neste período de um ano, que eu fui concebendo a ideia de ser mãe. Até então, a maternidade não era um sonho pra mim. Eu sabia que seria difícil engravidar, por tudo que meu organismo tinha passado. Mas eu fui entendendo que o meu desejo era mais maternar e não necessariamente gestar.
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Quando o médico me liberou pra começar as tentativas, eu engravidei no primeiro mês! Foi uma surpresa imensa, era um indício que meu organismo estava saudável e pronto para gerar um bebê, parecia inacreditável. E só então eu senti no meu coração o desejo forte de gestar. Pela primeira vez, eu me imaginei com um bebê nos braços.
O que eu não imaginava era que o sonho seria interrompido. Na oitava semana, eu soube que a minha gestação era anembrionária, quando um óvulo fertilizado se implanta no útero, mas o embrião não se desenvolve. Ainda teve mais: os exames de imagem mostravam a possibilidade de uma gestação molar, quando o saco gestacional se transforma em um tumor maligno.
Encarar o risco de um novo câncer era muito assustador. Mas felizmente uma biópsia mostrou que não era um tumor. Eu podia respirar aliviada quanto a isso. Mas, eu tinha perdido o meu bebê e eu sentia dentro de mim um vazio enorme. Eu vivi um luto solitário, para os outros o meu bebê não existiu.
Apesar de toda a tristeza, eu procurava me agarrar na ideia de engravidar novamente. Aquelas semanas de gravidez me encorajaram a assumir que eu queria e poderia gestar. Segundo os médicos, a gestação anembrionária é muito comum. Não tinha nada a ver com o tratamento. Então, eu decidi continuar tentando.
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Seis meses depois, eu engravidei de novo. E de novo, eu perdi. Os médicos nem consideram que foi um aborto, mas sim uma gravidez química. É uma condição em que o óvulo é fecundado, mas o embrião não se implanta no útero. Eu estive grávida durante uma semana. Foi tão pouco tempo, que eu nem cheguei a criar vínculo com o bebê. Dessa vez, o meu sentimento não era de tristeza, era de raiva.
Eu estava fazendo tudo que estava ao meu alcance. Acompanhamento nutricional pra melhorar a qualidade dos óvulos, meditação, corrida, ioga... E o que estava acontecendo? Era a vida, mais uma vez, me mostrando que eu não tinha controle de nada. No mesmo dia em que eu recebi a notícia desse aborto espontâneo, eu ia me apresentar como bailarina. Eu voltei a dançar depois que o tratamento de câncer acabou. Mas agora eu dançava um espetáculo solo chamado Inquieta Razão em que eu narrava de forma poética a minha história com a doença.
Eu estava a caminho do teatro quando eu decidi que aquela seria a última apresentação do solo. Eu não queria mais me envolver emocionalmente e fisicamente com aquela memória. E eu acho que essa foi uma das minhas melhores performances, expressei tudo que estava sentindo, raiva, frustração, medo, angústia e também concebi em cena que o câncer era um capítulo encerrado em minha vida.
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O Tainã está com um ano e cinco meses e ainda mama. Um único seio tem sido mais do que o suficiente pra atender as suas necessidades. E mais do que isso: eu produzo tanto leite que me tornei doadora de leite materno. Quanto mais eu amamento, quanto mais eu ordenho, mais eu produzo. E essa abundância me relembra diariamente a força da vida.
Amamentar nunca foi um fardo, nem mesmo nas madrugadas longas. Para mim, a amamentação é uma evidência da minha própria potência, da vida que flui em mim. E, como se não bastasse, amamentar ainda previne o câncer de mama. Se um dia meu corpo carregou uma doença, hoje ele jorra vida.
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Geyze Diniz: Nossas histórias não acabam por aqui. Confira mais dos nossos conteúdos em plenae.com e em nosso perfil no Instagram @portalplenae.
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Para Inspirar
Conheça a história de Zica, personagem do pilar Contexto e símbolo de perseverança, sucesso e resiliência
5 de Julho de 2020
Leia a transcrição completa do episódio abaixo:
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Introdução: Bem-vindo ao Podcast Plenae, um lugar onde você encontra histórias reais para refletir. Ouça e reconecte-se.
No episódio de hoje, a empresária Heloísa Assis, a Zica, como prefere ser chamada, compartilha sua trajetória de aprendizagem, superação e muita garra. A filha do meio da dona Dulce e do seu João já entrou para a lista da Forbes das 10 mulheres mais poderosas do Brasil, ao lado da Gisele Bündchen e da Luiza Trajano. Sua jornada ilustra o pilar Contexto. No final do relato você ouvirá reflexões do monge Satyanatha, nosso convidado especial dessa temporada, para ajudar você a se conectar com o seu momento presente. Aproveite este momento, observe seus sentidos e abra-se para uma nova visão sobre o mundo e sobre você mesmo.
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Zica Assis: Eu sou a filha do meio entre 13 irmãos, seis pra cima, seis pra baixo.
A gente cresceu na comunidade do Catrambi, perto do morro do Borel, na Tijuca, zona norte do Rio. Minha mãe lavava roupa para fora e meu pai vivia de fazer bicos.
A gente morava em um barraco de 20 metros quadrados, dois cômodos, chão de terra batida e telhado de zinco.
Nem tinha cama. Dormia tudo apertado, no chão mesmo. Apesar de todos os problemas, a energia da nossa casa era boa. Meus pais ensinavam que a gente tinha que se unir, se ajudar para superar as dificuldades. E era isso que a gente fazia.
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A minha maior alegria eram os bailes que aconteciam no sábado e domingo à tarde, perto de casa, num grande barracão de madeira azul. Como era matinê, com 7 anos eu já frequentava o baile e a comunidade toda ia. Naquela época, final dos anos 60, começo dos anos 70, a influência do soul americano era muito forte e as festas faziam concurso de melhor cabelo black power. Eu tinha um black enorme, o maior da comunidade e ganhei vários desses concursos. Eu morria de orgulho do meu belo pêlo. Ah, pêlo, é como a gente chamava o cabelo black na época.
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Apesar de fazer sucesso no baile, eu sofria preconceito na escola. Eu nunca pude sentar na frente da sala, porque o black incomodava ela. Quando ela me chamava a atenção por alguma coisa, ela não falava o meu nome, mas dizia assim: “Ô, menina, você aí do cabelo armado”. Ou ainda pior: “você aí do cabelo de arame farpado!” Não tinha a Heloísa, não tinha a Zica. Embora eu ficasse muito triste na escola, o maior problema não foi esse.
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Em casa, existia uma regra: quando a gente fazia 9 anos, tinha que começar a trabalhar. Minha mãe ficou sabendo que uma família do Alto da Boa Vista, onde só tinha mansões, precisava de uma babá pra uma criança de 5 anos, e ela me levou lá pra conhecer a patroa. Era uma casa enorme. O muro era de pedra e com um belo jardim. E logo no portão, a mulher olhou pra mim e falou: “com esse cabelo, você não entra. Tem que dar um jeito”.
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Eu fiquei paralisada por alguns segundos, sem entender o que estava acontecendo.
O que o meu black tinha a ver com tudo aquilo? Por que eu não podia apenas fazer o meu trabalho? Só acordei quando minha mãe segurou firme no meu braço, olhou pra mim e falou: “Seus irmãos precisam de comida! Vai ter que cortar o cabelo!" Cortar o cabelo, pra mim, era deixar de ir ao baile. Porque como eu ganhava os concursos eu não precisava pagar pra entrar. Sem meu pêlo eu ia deixar de me divertir. Mais do que isso, eu ia deixar de me achar bonita. Ele era a fonte da minha alegria. Eu fiquei arrasada!
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Fui pra casa e minha mãe cortou meu cabelo. Eu chorava muito. Não cortei curtinho, porque eu ainda queria me sentir menina. Aí ficou um blackzinho. Mas não…. não foi suficiente pra patroa. Eu ia ter que alisar. A maioria das mulheres da comunidade também alisava o cabelo pra trabalhar e minha mãe pagou uma vizinha fazer o meu. No quintal da casa dela, ela espalhou henê na minha cabeça. Henê é uma pasta química que alisa e colore o fio de preto. Depois, ela ainda passou um pente de ferro quente. Meu cabelo ficou totalmente liso. E eu me senti horrorosa. Ganhei um emprego, mas perdi a identidade.
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Nessa época eu chorava muito sozinha, mas nunca na frente da minha mãe e dos meus irmãos. Eu guardei essa tristeza dentro de mim e joguei a energia toda pro trabalho.
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Aí eu virei a melhor lavadeira da região. A melhor babá. A melhor faxineira. Eu prestava atenção nos detalhes: pegava as flores no jardim e colocava num vasinho, arrumava a cama bem bonita, fechava as cortinas da sala pra não esquentar a casa. Fui fazendo isso tão bem que as patroas me amavam. Para mim, ter um trabalho era fundamental para o sustento da minha família, mas por causa dele eu deixei de me divertir durante a infância e adolescência. Nem namorado eu tive, de tanto que eu me dediquei ao trabalho. Enquanto isso, eu continuava alisando o cabelo. Todo mês! Várias vezes eu não tinha dinheiro pro henê e passava ferro de carvão mesmo no cabelo. Parece até coisa de novela, né? Mas não é, não! Era assim mesmo.
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Na minha comunidade tinha sempre alguém que aprendia uma profissão e aí ensinava o outro. Quando eu tinha 21 anos, fiz um curso de cabeleireiro na Igreja de São Camilo de Lellis, ali mesmo no meu bairro. Não era um curso especializado que nem hoje. Eu nem pensava em ser cabeleireira, eu só queria aprender a cuidar do meu cabelo.
Por que meu cabelo crescia pra cima? Por que ele era grosso? Por que ele não tinha brilho? Mas principalmente, eu queria entender porque as pessoas associavam o crespo à sujeira e a desleixo. Infelizmente, o curso não deu as respostas para as minhas perguntas. Porque, na verdade, o que ele ensinava era o alisamento que todas as minhas vizinhas faziam. Mas ali nasceu uma paixão.
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Eu acabei fazendo amizade com os fornecedores de henê e de pasta para alisar o cabelo e pedi para que eles me trouxessem não os produtos prontos, mas as matérias-primas. E aí, eles chegaram com um monte de pozinho. E eu nem sabia o que era o quê. Mesmo assim fui pro tanque, separei uma bacia com água, uma colher de pau e comecei a misturar os pozinhos de qualquer jeito, sem seguir nenhuma receita.
Na maior inocência, apliquei aquele negócio em metade do meu cabelo, da raiz até a ponta. E… surpresa… Meu cabelo caiu todo. Foi horrível ver o meu cabelo se desfazendo na minha mão. Mesmo assim coloquei um lenço na cabeça e não desisti.
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Os anos passaram, eu casei, tive três filhos e continuei fazendo faxina para colocar dinheiro em casa. Mas, nos fins de semana, quando tinha um tempinho, eu ia pro tanque e fazia minha alquimia. Quer dizer, eu não entendia absolutamente nada de química. Eu misturava tudo o que você pode imaginar. Pegava os pozinhos e misturava com azeite, óleo de cozinha, sabão e o que tivesse à mão.
Aí, teve uma época que o meu marido se chateou. Meu cabelo tava destruído, cheio de buraco no couro cabeludo. Eu vivia de lenço. Ele implicou muito e eu falei: “Quer saber? Vou pegar meus irmãos de cobaia”. Porque em casa era lei: os irmão mais novos tinham que obedecer os mais velhos.
E aí eu escolhi o Rogério, que já era meu parceiro, entregando as roupas que eu lavava. O cabelo dele também caiu várias vezes com as minhas misturas, coitado. Mas ele esperava crescer e deixava eu passar de novo.
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Depois de oito anos e muito cabelo estragado, eu recebi o primeiro elogio. Eu estava voltando pra casa depois de um dia de trabalho e uma prima minha me parou na rua. Ela falou que meu cabelo estava lindo! Mais do que isso, ela pegou no meu cabelo e perguntou o que eu estava passando, pra passar no dela também.
Foi incrível, porque naquela época ninguém nunca elogiava o meu cabelo, só o meu trabalho, a minha alegria… Mas não o meu cabelo. Nesse dia, quando eu cheguei em casa, corri pro banheiro e me olhei no espelho. Meu cabelo estava hidratado, com balanço e cachos definidos. Minha vida começou a mudar aí!
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Eu já tinha 33 anos, ainda era empregada doméstica, ajudava a sustentar a minha casa quando consegui a patente do "Super-Relaxante". Tinha chegado a hora de arriscar. Meu marido, que é 20 anos mais velho que eu, já era aposentado. Com o dinheiro da rescisão na empresa, ele tinha comprado um Fusca 78 e trabalhava como taxista na comunidade. Era o único bem de grana da família. Convenci ele a vender o carro e investir em um salão de beleza. Acontece que o dinheiro ainda não era suficiente. Meu irmão Rogério, que já tinha sido meu parceiro de baile e cobaia de cabelo, virou meu sócio, e ele trouxe junto a Leila. Nós juntamos o que hoje seriam uns 4.200 reais.
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A última faxina que eu fiz na vida foi numa segunda-feira. Eu sei, porque abrimos o Beleza Natural no dia seguinte, 27 de julho de 1993, lá na Tijuca. Esse dia marcou a minha vida. O salão ficava em uma casa de fundos, com uns 30 metros quadrados e mais de 100 anos. Tinha piso de cimento, pé direito alto e as paredes descascadas. Tinha café passando na hora e, principalmente, era feito para as mulheres de cabelos crespos e cacheados, coisa que o mercado não enxergava na época. Era pobrezinho e pequenininho, mas acolhedor e inovador.
No primeiro dia eu, meu marido, meu irmão e a Leila fomos de ônibus até lá. Quando eu coloquei a chave no portão minhas mãos tremiam a suavam. Abrimos às 9h em ponto. E no dia inteiro... Não apareceu ninguém. Nem as vizinhas que me incentivaram a abrir o salão. Pra não dizer que não entrou ninguém, a minha família chegou de noite, pra festa de inauguração. Eu fiz salgadinhos, comprei refrigerante e brindamos com espumante nacional. Eu chorei de emoção várias vezes naquele dia, porque eu me vi como profissional, como empresária, como patroa.
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Dois dias depois que a gente abriu o salão, o Itamar Franco, presidente na época, anunciou o Plano Real. Acabou a inflação e começou a ascensão da classe C. As primeiras clientes começaram a chegar. Em três meses, já tinha fila na porta. Quando o salão abria, às 9h, já tinha umas 100 pessoas esperando. A gente teve que começar a distribuir senhas e saía do salão meia-noite, uma da manhã, porque não dava conta!
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Hoje, nós somos uma rede com 38 endereços em 5 estados. Quando acontece alguma coisa que me deixa triste, eu olho para trás e penso de onde eu vim, da comunidade de onde eu saí e que agora eu consigo ajudar. Eu lembro dos concursos que eu ganhei, do meu cabelo sendo cortado, das faxinas, dos pozinhos misturados, do meu irmão deixando o cabelo dele crescer só pra eu testar tudo de novo.
Lembro da minha prima elogiando meu cabelo lindo, da patroa que me incentivou e da química que acreditou em mim. Lembro do meu marido vendendo o fusquinha dele e do meu irmão e da Leila juntando o dinheirinho suado deles pra me ajudar. E aí eu levanto a cabeça, dou um sorriso e tá tudo bem.
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Satyanatha: Chegamos ao fim da história da Zica. Não tem nada mais bonito do que aprender a ser você mesmo. A Zica insiste em ser ela. Tem uma música do Cartola que diz: “Deixe-me ir, preciso andar, ir por aí a procurar, rir pra não chorar. E se alguém por mim perguntar, diga que só vou voltar depois de me encontrar”. Conhecer a si mesmo é encontrar uma vibração que é só sua, algo especial que só você tem. O “eu” não é um ponto, mas é uma frase, uma prosa fluida.
Quando a gente descobre e aceita quem se é, alcança o ápice produtivo. Se eu, que sou monge, tentasse ser matemático, a minha contribuição pra humanidade seria menor. A Zica era uma excelente faxineira, mas ajudou a mudar a vida de muito mais gente porque persistiu na busca pela sua identidade, até encontrar a fórmula para embelezar os seus cachos. A identidade deu a ela a sensação de pertencimento.
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Finalização: Nossas histórias não acabam por aqui. Acompanhe semanalmente novos episódios e confira nosso conteúdo em plenae.com e no perfil @portalplenae no Instagram .
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