Para Inspirar

Camila Gomes em “Benzer é abençoar com fé, amor e esperança”

Inspire-se com o episódio de Espírito da décima oitava temporada do Podcast Plenae - Histórias para Refletir!

1 de Dezembro de 2024



Leia a transcrição completa do episódio abaixo:

[trilha sonora] 

Camila Gomes: Fizeram um mapeamento das benzedeiras de Florianópolis e seus saberes e eu fui catalogada como a benzedeira mais jovem. Não foi fácil abrir mão da carreira de psicóloga pra me dedicar a essa função. Eu tive medo. Mas dentro de mim eu sentia que deveria servir a espiritualidade dessa maneira.

[trilha sonora]
 


Geyze Diniz: Desde pequena, Camila Gomes sempre teve o hábito de rezar em muitas situações do dia a dia e não poderia imaginar que essa atitude se tornaria sua vocação. Depois de passar por algumas religiões, como o catolicismo, o kardecismo e a umbanda, ela se tornou benzedeira, abençoando com palavras de fé, amor e esperança. Eu sou Geyze Diniz e esse é o Podcast Plenae. Ouça e reconecte-se. 

[trilha sonora]

Camila Gomes: Desde pequena, eu já era benzedeira sem saber. Eu me lembro de estar na fila de um banco e ver uma criança chorando. Eu não conseguia ignorar aquela situação e fiquei pensando o que eu podia fazer. Daí eu fechei os meus olhinhos e rezei. A criança foi se acalmando e eu fui me acalmando também. Eu devia ter uns 7 anos. 

Rezar faz parte do meu cotidiano desde que eu me conheço por gente. Eu nasci numa família católica não praticante e estudei num colégio de freira. Antes de deitar, a minha mãe rezava comigo a oração do Anjo da Guarda. Era assim: “Anjinho da guarda, meu bom amiguinho, guiai-me sempre pelo bom caminho.” Tinha até um quadro com essa oração no meu quarto. Muitas vezes, eu ficava conversando mentalmente com esse Anjinho da Guarda até dormir. 

A reza nunca foi só uma repetição de palavras
pra mim. Eu tenho uma memória de estar sozinha no meu quarto, fazer uma oração e chorar por sentir uma paz profunda. Minha avó paterna, muito católica, me explicou que esse bem-estar que eu sentia era a presença do Divino Espírito Santo. Pra mim sempre foi muito simples: se eu tinha algum problema, era só rezar que melhorava. Só mais tarde eu descobri que não funcionava assim pra todo mundo. 


[trilha sonora] 

Eu gostava tanto de ir à igreja que queria ser freira. Aí, na catequese, eu descobri que só os padres podiam celebrar missa. Foi um balde de água fria. Eu fiquei tão magoada, que quase chorei. Eu me lembro que as crianças ao meu redor debocharam de mim, como se o desejo de ser freira fosse ridículo. Eu comecei a me desconectar do catolicismo na adolescência, quando estudei história e desenvolvi uma consciência crítica.

Eu fiquei muito decepcionada com o passado violento e
castrador da igreja. A ruptura aconteceu na época da crisma, quando eu passei dois anos indo à igreja todos os domingos. No dia do sacramento, por rebeldia, eu decidi que eu não iria me vincular àquela religião. E aí eu simplesmente não fui à cerimônia.
 

Foi mais ou menos nessa época que eu descobri o kardecismo, assistindo à novela
A Viagem, que passava na TV Globo. Nessa época a minha mãe ganhou um livro de Allan Kardec e começou a trazer as leituras dele pra nossa casa. A gente passou a frequentar centros espíritas pra tomar passe, mas eu sentia falta do ritual da missa. A minha ligação com o kardecismo nunca foi tão forte quanto com a igreja católica. 
 

[trilha sonora] 

Mesmo sem um vínculo religioso, eu nunca deixei de rezar, até porque reza pra mim é tão automática quando escovar os dentes antes de dormir. A espiritualidade voltou com força depois de um problema de saúde, aos 22 anos. A essa altura, eu já estava na faculdade de psicologia e engravidei sem planejar. No quinto mês de gestação, eu senti uma dor nas costas violenta. Fui pro hospital e descobri que estava com pedra no rim.

Me deram remédio e
eu voltei pra casa, só que o medicamento mascarou os sintomas. Dias depois, eu tive uma febre de quase 40 graus e comecei a delirar. Me levaram pro hospital de novo e eu fui diagnosticada com pielonefrite, uma infeção grave no rim. A febre tinha secado 70% do líquido amniótico, e o meu bebê estava em sofrimento fetal.
 Os médicos queriam induzir um aborto, mas eu não concordei. Daí eles tentaram repor o líquido amniótico com um soro intravenoso.

Eu tomei litros e litros de soro, até que meu rim direito parou de funcionar e eu fiquei uma mulher elefante, muito inchada. 
Mesmo grávida, eu tive que fazer uma cirurgia pra colocar um cateter no rim. A operação deu certo, mas eu ainda passei quase três meses internada. Muitas rezas e médicos competentes salvaram a minha vida e a do meu filho. Mateus nasceu com 36 semanas de gestação e saudável. 

[trilha sonora] 

Como eu não tinha histórico de problema renal, os médicos acreditavam que depois do parto o rim voltaria ao normal. Mas não foi o que aconteceu. Eu tive alta com um dreno no rim. Nos primeiros dois anos depois da cirurgia, eu vivia fazendo exames e consultas. Nenhum médico entendia porque o meu rim não funcionava direito. Foi o período mais difícil da minha vida.

Eu dividia o meu tempo entre a faculdade, o estágio e os cuidados com o Mateus.
Pra piorar, o meu relacionamento com o pai do meu filho não deu certo. E aí a minha saúde gritou. Eu comecei a ter episódios de desmaio, mal-estar e suor frio. O meu estágio era num projeto social de adolescentes numa comunidade carente. Toda vez que eu atendia pacientes, eu passava muito mal e ouvia vozes. No início, eu achava que era por causa dos antibióticos que eu tomava para controlar a infecção no rim.
 

Até que, durante uma aula
de psicopatologia, eu aprendi sobre os critérios para fechar um diagnóstico de esquizofrenia e me identifiquei com quase todos. Meu Deus, era só que me faltava! Como eu ia conseguir criar uma criança nessa condição? Naquele dia, eu entrei numa catarse. Cheguei em casa, pedi pra minha mãe cuidar do Mateus e avisei: “Mãe, eu mal”. Eu chorei, chorei, chorei. Num ato de desespero e exaustão, eu resolvi rezar igual eu fazia na infância. Eu estava apavorada e pedi saúde pra poder cuidar do meu filho. 
 


[trilha sonora] 

Menos de uma semana depois desse dia, numa reunião do estágio, eu peguei o elevador com uma colega que conhecia muito pouco. Eu não lembro porque eu comentei que tinha separado e que estava morando com a minha mãe. Aí essa colega me falou assim: “Ah, então é você a morena de cabelo comprido que o Preto Velho mandou chamar”. Eu disse: “Hãn?”. Daí ela falou: “Não, é porque eu trabalho com cura aos finais de semana. A gente tem um grupo e tal…”. Quando ela falou a palavra “cura”, eu lembrei na hora da minha oração. E ela continuou: “O Preto Velho mandou chamar uma mulher de cabelo comprido do meu trabalho que ia se separar. É você”. 

Essa minha colega não sabia quase nada da minha vida. A nossa relação era bem superficial e nova. Mas eu acreditei nela. Pedi o endereço, a data, o horário e fui de roupa branca, como ela recomendou. Eu não sabia o que esperar, mas imaginava que seria recebida por um idoso negro. Quando eu cheguei lá, descobri que era um ritual de umbanda, uma religião que eu desconhecia. E o Preto Velho era, na verdade, um jovem branco que incorporava uma entidade com esse nome.  

 
O médium começou a falar comigo como se ele soubesse o que se passava na minha cabeça. Ele falou sobre a minha conexão com o sagrado, sobre a minha avó paterna. Disse que desde criança me acompanhava, que era um dos meus guardiões. Falou da minha gravidez, do meu processo de saúde, da faculdade. Disse que eu tava sendo forjada pela espiritualidade pra trabalhar no espaço da saúde mental. Ele falou ainda que as vozes na minha cabeça eram, na verdade, mediunidade. 

Eu fiquei super emocionada. Eram coisas que quase ninguém sabia sobre a minha vida. O Preto Velho disse que eu devia frequentar aquela roda todo domingo. Falou que ele ia me ensinar a rezar e a mexer com as ervas, pra eu me curar. Depois que eu melhorasse, eu poderia ajudar outras pessoas a se curarem também. Segundo ele, o meu problema no rim não era físico. Era só o caminho que me levaria até a espiritualidade e ao meu propósito: servir o outro.  

[trilha sonora] 

Foi tudo meio mágico. Eu passei a frequentar os encontros e o meu rim melhorou. Quando eu aprendi a controlar a mediunidade, parei de ouvir as vozes. Eu passei sete anos nesse grupo de umbanda. No final, eu já estava num novo relacionamento, tinha me formado em psicologia e estava grávida do meu segundo filho, o Chico.  

As entidades diziam que eu estava pronta pra ser uma sacerdotisa, uma mãe de santo. Mas eu não queria fincar a minha bandeira na umbanda. A minha ligação é com a espiritualidade, não com a religião. Dogma não é comigo. Eu falei isso pras entidades, e aí o Preto Velho disse: “Ah, filha, você pode fazer então como as suas ancestrais e se tornar benzedeira. Leva o legado, sem precisar levar a religião”. 

Quando o Preto Velho falou sobre as minhas ancestrais, eu pensei que era sobre a minha avó paterna. Ela não era benzedeira, mas era rezadeira. Nesse processo de me tornar benzedeira, casualmente eu fui morar na Lagoa da Conceição, uma região de Florianópolis. Sabia que a minha avó materna havia nascido lá. Eu comecei a perguntar sobre ela pra minha tia e descobri que a minha bisavó, a mãe da minha avó, foi considerada santa na Lagoa da Conceição. Ela morreu no parto de gêmeos e foi enterrada com os dois bebês no colo.

A minha avó tinha dois
pra três anos quando a mãe dela faleceu. Um tempo depois, foram remover as ossadas e descobriram que os corpos dos bebês tinham sido consumidos pela terra, mas o corpo da minha bisavó estava intacto, e o cabelo dela tinha crescido. Virou um burburinho na comunidade e ela foi considerada santa. Desde então, todas as mulheres que tinham problemas de parto ou com filhos pequenos rezavam pra ela. Eu achei curioso me tornar benzedeira no lugar onde as minhas sementes femininas vieram.
 

[trilha sonora] 

Benzer, na etimologia, significa dizer o bem. Uma benzedeira abençoa com palavras encharcadas de fé, amor e esperança. A fé é o que abre a porta da pessoa que vai ser benzida. Se ela não tiver fé, nem adianta se benzer. Já o amor é a fonte curativa Divina, presente em tudo que há. É como uma chama que existe dentro de cada um de nós, uma força que eu ativo dentro de mim e propago pela fé. E a esperança é o fio que conduz a chama do amor.  

Antigamente, as benzedeiras tinham um papel super importante nas comunidades. Elas cuidavam das pessoas com suas rezas, ervas e rituais. Só que, por não se renderem aos dogmas religiosos e decidirem seguir livres, elas começaram a ser perseguidas e chamadas de bruxas, porque não seguiam a religião oficial. Muitas foram assassinadas. E assim, com medo do julgamento, elas foram desaparecendo.  
 

Ser uma benzedeira contemporânea é exercer a função de conexão com a espiritualidade e com a natureza. Mas também é lutar pelo reconhecimento desse trabalho, inclusive pedindo que ele seja pago. A benzedeira de hoje é uma mulher que não se curva, que se entende como livre e sagrada. E que questiona os papéis que sempre foram impostos às mulheres na sociedade. 

[trilha sonora] 

Desde 2012, eu sigo alinhando os saberes ancestrais que recebi em sonhos, em psicografias e práticas da umbanda com os saberes científicos que estudei na universidade. Como benzedeira, eu pude realizar o meu desejo de infância, que era celebrar missa. Ou pelo menos a minha versão da missa. Na pandemia, eu comecei a receber muitos pedidos pra benzimentos à distância. Teve um dia que eu benzi 500 pessoas!

Eu comecei a pensar como eu po
dia continuar benzendo, mas sem me esvair energeticamente. Daí eu criei uma métrica pra fazer um benzimento coletivo e misturei esse ritual com arte. Hoje, eu tenho um espetáculo chamado Roda de Benção, que acontece no teatro uma vez por mês. É uma maneira de preservar a cultura imaterial do benzer. Assim, as futuras gerações podem conhecer essa prática ancestral de forma artística e desvinculada de dogmas religiosos.
 

Eu gosto de ensinar as pessoas a se abençoarem e a abençoar também. É assim: eu fecho os olhos, entro em contato com a minha respiração, inspiro e expiro. Eu sinto a presença do Divino dentro do coração e irradio essa força pros ombros, pras mãos. Daí eu mentalizo a pessoa e encaminho todo o amor que houver para ela. Nessa conexão com o Divino, eu propago fé, amor e esperança em ondas.  

[trilha sonora] 

Pra terminar esse episódio, eu convido você a receber uma bênção agora. Então, eu vou pedir pra que você feche os olhos, se puder, respire fundo, atente na sua respiração. Se vier qualquer pensamento, deixa passar, não se apegue a ele. Respira fundo. Eu peço nesse instante aos Anjos Guardiões de cada um dos irmãos e irmãs que aqui se fazem presente para que eu possa adentrar seus espaços sagrados e lhes entregar essa benção, essa graça: 

Divina mãe da Conceição da Poderosa Criação, tira todo mal, todo banto, todo e qualquer quebranto do campo físico e extrafísico de cada um dos irmãos e irmãs neste momento. Deus o fez e o criou, Deus perdoa quem mal os olhou, em louvor a todas as mães e Marias eu rezo nesse instante e evoco a chama violeta para que limpe e dissipe todo miasma, toda energia deletéria, toda forma de pensamento, toda e qualquer energia contrária que nesse instante possa estar obstruindo a conexão com o Sagrado e o Divino dentro da vida de cada um dos irmãos e irmãs. 

Eu evoco ainda nesse instante Nossa Senhora da Conceição, mãe Oxum acolha cada um dos teus filhos e filhas neste instante e sobre teu manto sagrado possas nutri-los do teu amor, da tua fé, da tua coragem, misericórdia, resiliência para que sintam a tua presença em luz, dentro do seu ser. Evoco ainda, grande Mãe misericordiosa, para que nesse instante acendas a centelha Divina que pulsa e arde dentro do peito de cada um dos irmãos e irmãs ativando a força do amor, da fé e da esperança nutrindo cada célula do corpo físico e extrafísico de cada um dos meus irmãos e irmãs nesse instante.

 Eu
vos abençoo, meus irmãos e irmãs. Mas é a fé e a ancestralidade que os abençoa, os reza e os cura. Diante dos quatro elementos da natureza, fogo, terra, água e ar, da força motriz do amor, da fé e da esperança, eu vos entrego essa benção. Abençoados estão em nome do Pai, do Filho, do Espírito Santo, amém. 
Inspira com profundidade, solte o ar devagar pela boca e, aos poucos, pode ir retomando o estado presente, abrindo os olhos, sentindo a presença da benção dentro do seu coração. Que assim seja, axé, amém.

[trilha sonora]

Geyze
Diniz
: Nossas histórias não acabam por aqui. Confira mais dos nossos conteúdos em plenae.com e em nosso perfil no Instagram @portalplenae. 

[trilha sonora]
 

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Para Inspirar

Felicidade promove vida longa e saudável, diz estudo

Homens e mulheres mais felizes tendem a envelhecer melhor e desfrutar de mais anos sem incapacidades

19 de Julho de 2019


A felicidade pode realmente ser um dos melhores remédios disponíveis para nós, sugere um novo estudo publicado no periódico JAMA Network Open . Pessoas que se declaram felizes consigo mesmas e com seu bem-estar tendem a viver vidas mais longas e saudáveis ​​do que aquelas que se dizem tristes, revelaram pesquisadores da Universidade College London, no Reino Unido.

Mulheres na faixa dos 50 anos que relataram curtir suas vidas tinham uma expectativa de vida estimada em quase 37 anos a mais, comparado a 31 anos daquelas que se sentiam deprimidas e infelizes. O mesmo aconteceu com os homens ao redor dos 50 anos.

Os que se declaravam felizes tinham uma expectativa de vida de 33 anos a mais, ante 27 anos dos que não se diziam contentes. Homens e mulheres mais felizes também tendem a envelhecer melhor e desfrutar de mais anos sem incapacidades e doenças crônicas.

Pesquisa

Os cientistas analisaram dados de quase 10 mil pessoas entre 2002 e 2013. Eles se concentraram especificamente na percepção de "bem-estar subjetivo", isto é, o quanto as pessoas estão aproveitando sua vida e como se sentem sobre sua própria saúde e humor. Em seguida, os pesquisadores confrontaram as declarações dos participantes com a saúde real deles.

Assim, concluíram que a felicidade está ligada a uma vida mais longeva e saudável. Ainda não há uma explicação clara para a associação entre felicidade e saúde, disseram os especialistas. “Uma possibilidade é que um estado constante de infelicidade produz muito estresse”, disse Nancy Mramor, psicóloga americana não envolvida no estudo. "Quando você pensa que sua saúde é ótima, mesmo que não seja, envia sinais positivos para o corpo."

Para James Maddux, professor de psicologia clínica da Universidade George Mason, nos Estados Unidos, a terapia cognitivo-comportamental e a psicoterapia podem ajudar os adultos a ajustar a maneira como vêem suas vidas e respondem ao estresse.

Fonte: Dennis Thompson, para HealthDay Reporter
Síntese: Equipe Plenae
Leia o artigo completo aqui .

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