Para Inspirar
Inspire-se com o episódio de Propósito da décima oitava temporada do Podcast Plenae - Histórias para Refletir!
1 de Dezembro de 2024
Aline Bertolozzi: Quando eu coloquei os pezinhos do Léo na areia pela primeira vez e a onda do mar bateu em nossas pernas, eu falei no ouvido dele: “Filho, lembra que eu te contava na UTI como era a praia? Lembra que eu falava como a vida era boa?”. Ele abriu o maior sorriso.
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Geyze Diniz: Aline Bertolozzi lutou pela sobrevivência de seu filho, Léo, desde a barriga. Léo ainda precisa de aparelhos para viver, o que o manteve dentro de quatro paredes por muito tempo. Percebendo os benefícios de viver a vida “lá fora”, a família de Aline criou a ‘Outcare’, uma mochila que permite incluir socialmente pessoas eletrodependentes e seus cuidadores. Eu sou Geyze Diniz e esse é o Podcast Plenae. Ouça e reconecte-se.
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Aline Bertolozzi: No primeiro ultrassom da gravidez, estava tudo normal. Então, eu e meu marido programamos fazer uma viagem pro exterior pra fazer o enxoval do Léo nos Estados Unidos. A gente já até sabia que era um menino, mas me deu algo que eu não sei explicar. Eu fiquei pensando: e se o exame tivesse errado? E se fosse uma menina? Não sei por que.
Foi então que eu pedi pro médico repetir o ultrassom antes da viagem. E aí, com 17 semanas de gestação, o resultado mostrou que o nosso bebê tinha várias alterações sérias. A gente começou a investigar todas as possíveis síndromes e doenças que poderiam ter causado aquelas deformações. E um dos exames mostrou que ele tinha uma síndrome raríssima, chamada Síndrome de Chaos.
O Chaos, ele é só uma má formação nas vias aéreas do bebê. Ele é uma obstrução em dos aneizinhos que a gente tem na traqueia. Apesar de parecer simples, os médicos me explicaram que a qualquer momento eu teria um aborto, porque um feto com essa síndrome não chega a nascer com vida. O coração do Léo estava esmagado por um acúmulo de líquido e ia parar de bater.
Naquele momento, os médicos me deram duas escolhas. Eu podia entrar na Justiça e conseguir uma autorização pra um aborto legal. Ou eu podia fazer de tudo pro Léo sobreviver o máximo de tempo possível. Eu não tive dúvida. Eu escolhi deixar a minha vida em função da vida do Léo.
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Os médicos que me acompanhavam naquele momento me disseram que havia um médico especialista em medicina fetal e que talvez ele pudesse nos acompanhar. Havia sido ele quem tinha feito a primeira cirurgia do mundo de traqueostomia intraútero. E talvez, se meu filho fizesse essa cirurgia, ele teria uma única chance de sobreviver. Essa cirurgia inédita aconteceu só 15 dias antes da gente receber o nosso diagnóstico. Eu achei tão curioso duas grávidas terem a mesma síndrome raríssima na mesma época, no mesmo lugar com os mesmos médicos.
A gente procurou esse médico de medicina fetal e ele falou que não podia fazer a nossa cirurgia. Ele explicou que precisava esperar o outro bebê nascer pra saber se tinha dado certo. Ele não queria fazer duas cirurgias experimentais uma atrás da outra. Mas eu implorava pra ele me operar. Eu insisti tanto, que ele falou pra gente fazer uma reunião com a equipe médica pra então decidir se ele faria essa cirurgia ou não.
Só que, no dia do exame, não deu pra ver nada. O Léo estava virado de cabeça pra baixo, ele estava bem encolhido e não se mexia. O médico, que era super experiente, tentou diversas formas, diversas manobras pra mudar o Léo de posição, mas ele não conseguiu. E aí, o médico, meio desapontado me disse: “Filha, vai para o quarto hoje. Amanhã, às 9 horas da manhã, a gente faz uma reunião com os médicos”.
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Eu queria muito ter o Léo. Eu nunca tive problema em aceitar que ele seria uma criança com deficiência. A minha única dificuldade era entender o porquê ele não ia nascer. Mas eu não queria ser egoísta e pensar só em mim. E naquela noite, eu rezei muito e eu pedi muito pro Léo: “Filho, se você quer uma chance de nascer, me dê um sinal”. E pela primeira vez, em toda gravidez, eu senti minha barriga mexer. O Léo nunca tinha se mexido, porque o coraçãozinho dele não tinha forças pra mais nada.
No dia seguinte, a gente voltou pra sala de ultrassom. E quando o médico colocou o aparelho na minha barriga, na hora ele falou: “Eu não acredito. O Léo virou. Ele tá na posição que eu precisava”. E então ele disse: “Léo, agora só falta você levantar o pescoço”. E o Léo levantou o pescoço e ficou parado. O médico se emocionou e na hora ele afastou a cadeira, sem nem perguntar a opinião dos outros médicos, e disse: “Eu opero esse bebê”.
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E foi assim que, com 24 semanas de gestação, nós nos tornamos a segunda família no mundo a passar pela traqueostomia intraútero.
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A cirurgia foi um sucesso. No dia seguinte, o corpinho do Léo já estava todo normal. O problema foi que eu peguei uma infecção, e o parto do Léo aconteceu com 25 semanas. E ele nasceu com pouco mais de 5 meses de gestação, pesando apenas 630 gramas. Da sala de parto, ele foi levado direto pra UTI neonatal. Estava indo tudo bem, mas com 1 mês de vida ele foi acometido por uma infecção no intestino e precisou ser levado às pressas para uma cirurgia.
Os médicos saíram super desanimados do centro cirúrgico e liberaram a minha família pra se despedir dele na UTI. Até então, só eu e o meu marido podíamos estar com o Léo. Eu não queria aceitar que o Léo que tinha lutado tanto pra sobreviver estava indo embora, eu me neguei a dizer que seria uma despedida. Então eu falei pra minha família que agora eles podiam finalmente conhecer o Léo. Eu queria que o clima na incubadora fosse de alegria e não de tristeza.
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O Léo sobreviveu às primeiras 24 horas depois da cirurgia. Dois dias se passaram, três dias, uma semana… Os médicos nem sabiam explicar muito bem o que estava acontecendo, que ele continuava vivo. Eu sempre buscava alguma coisa positiva pra contar pro Léo. Teve um dia que uma moça que tava limpando a janela da UTI, ela esqueceu uma frestinha aberta e um raio de sol batia na incubadora do Léo. Então, eu abri a incubadora dele e falei: “Filho, você não vai acreditar. O dia tá lindo. Um dia nós vamos sair daqui e eu vou te levar na praia”.
E aí todos os dias eu passei a contar pro Léo como era a praia, como era a areia, como era o vento. Os médicos, nessa época, começaram a duvidar da minha sanidade. Achavam que eu não estava entendendo a gravidade da situação. Teve uma que me falou assim: “Aline, você não está sendo egoísta? Se ele sobreviver, ele vai ser só um vegetal, qual a condição você quer esse filho?”. E eu falei: “Doutora, hoje ele tá vivo? Então vamos pensar no hoje, porque se ele vai morrer, nem adianta imaginar o futuro”.
No meio desse caos, teve um dia em que os médicos finalmente deram uma notícia boa: os exames estão estáveis. A gente ficou muito feliz só de saber que o Léo não tinha piorado. E aí meu marido decidiu ir embora do hospital um pouco mais cedo, pra assistir o jogo do São Paulo na TV. Só que, na esquina de casa, ele foi assaltado e levou um tiro no pescoço.
A bala atravessou a traqueia, a laringe, a faringe e queimou as cordas vocais. Foram 10 dias em coma e os médicos disseram que a condição dele era muito grave. Se ele sobrevivesse, ele ia ficar tetraplégico, porque o tiro trincou os ossos das duas vértebras. Talvez nunca mais ele falasse e ainda tivesse sequelas neurológicas.
A minha reação foi a mesma que eu tive quanto eu tive o diagnóstico do Léo: façam tudo que a medicina puder pra salvar a vida dele. Se eu tivesse que empurrar duas cadeiras de rodas, pra mim tava tudo bem. Eu só queria os meus meninos vivos, não importava em qual condição.
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Nesse período, eu nem voltava mais pra casa. Eu ficava indo de um hospital pro outro, dormindo em qualquer poltrona, comendo qualquer comida. Eu repeti a mesma estratégia que eu usava com o Léo. Quando eu visitava o Léo eu falava: “Filho, o papai tá morrendo de saudade de você. O papai ficou muito feliz que você melhorou”.
Ia visitar o Rodrigo e falava: “Ro, você não vai acreditar, o Léo tá lindo, ele engordou. Ele tá morrendo de saudade de você. Fica tranquilo e descansa, que com a gente tá tudo bem”. É óbvio que nos corredores e dentro do táxi eu chorava, mas eu só passava mensagem positiva pros dois.
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Dez dias depois do assalto, os médicos tiraram meu marido do coma induzido. Todos os médicos ficaram surpresos porque ele acordou falando. Ele contou que tinha tido um sonho, que sonhou com a gente, nós estávamos no aeroporto, o Léo estava grandinho, e tinha muitas pessoas dando tchau para a gente E não foi só isso. No primeiro dia, o meu marido se levantou e tomou banho de pé.
A neuro que acompanhou o caso falou pra gente: “Eu não sei qual é a religião de vocês. Mas a medicina não explica o que aconteceu aqui”. O meu marido não ficou com nenhuma sequela do tiro. Ele teve alta 14 dias depois do assalto e no décimo quinto dia já estava de volta pro trabalho. O sonho que o meu marido teve em coma e a recuperação dele deixaram bem claro pra nós que a gente tinha uma missão a cumprir. Só que, enquanto isso, a situação do Léo continuava grave.
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Ele teve um sangramento na retina por nascer prematuro e acabou ficando cego. Ele teve uma hemorragia cerebral que o deixou com paralisia cerebral. Depois de 6 meses nessa UTI Neonatal, nós transferimos ele de hospital. E depois de 11 meses pudemos levar o Léo para a casa de home care. Com 1 ano e 8 meses, meu filho só tinha passado alguns meses em casa, em home care. E a minha vida só girava em torno dos cuidados dele.
Até que um dia, ele teve uma febre e a gente levou ele pro hospital sem saber o que ele tinha. E ele então foi diagnosticado com uma infecção generalizada e foi levado às pressas pra a UTI. Foram 4 meses e diversas complicações. E foi um dia, eu falei pra médica: “Doutora, eu sei que a situação do Léo é grave. Mas, se ele for morrer, eu queria que ele morresse na minha casa”.
A médica concordou e a gente optou por um sistema inédito no Brasil que é a desospitalização sem home care. Eu e meu marido fomos treinados pela equipe do hospital pra fazer todos os cuidados que o Léo precisava. Chegamos em casa e o Léo teve uma piora da parte respiratória, A médica aconselhou que a gente levasse o Léo de volta pro hospital, mas eu pedi pra ela: “Doutora, me dá 24 horas. Se em 24 horas o Léo não melhorar, eu levo ele de volta pra UTI”. Ela ficou na dúvida, mas acabou aceitando o meu pedido.
Eu estava sozinha em casa nessa hora. Olhei pro Léo e pensei: o que que a gente vai fazer com essas 24 horas? Então, eu decidi levar ele no parquinho do prédio. Eu amarrei o respirador, a bomba de infusão, o oxímetro, o oxigênio. Coloquei algumas malas nas minhas costas, montei uma UTI naquele carrinho e desci no parquinho. E foi então, que o Léo ouviu vozes de crianças e ele abriu o maior sorriso. E depois desse dia, o Léo nunca mais teve nenhuma internação hospitalar prolongada. Já faz 8 anos que ele tá em casa.
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Naquele dia, eu descobri que viver cura e decidi fazer tudo diferente a partir dali. Eu diminuí as terapias do Léo e parei de buscar mais médicos e mais especialistas. A gente começou a passear, primeiro bem perto de casa, e depois um pouco mais longe. Um ano depois, nós precisávamos fazer uma viagem pro Rio e a gente levou o Léo pra passar 48 horas na cidade.
Quando a gente chegou no Rio de Janeiro, decidimos subir o Cristo Redentor. Lá em cima a gente precisou aspirar a traqueia do Léo, um procedimento que necessita de energia elétrica, mas o segurança proibiu que a gente usasse a tomada. A gente precisou descer correndo para o carro para usar a bateria e voltamos para o hotel indignados.
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Eu falei pro meu marido, a gente não pode ficar dependente de pessoas e tomadas, nem todos serão bons e disponíveis em ajudar, e se a gente pegasse uma bateria de caminhão, será que a gente não conseguiria fazer uma adaptação? Aí o meu marido, que estudou engenharia elétrica, falou que a gente podia pegar simplesmente uma bateria de moto, colocar numa mala e não depender de mais tomadas.
E eu achei a ideia incrível.
Quando a gente chegou em casa, o meu marido arranjou a bateria, a minha mãe costurou uns velcros na mala pra prender e o meu irmão comprou as peças que faltavam para montar a nossa mochila. Depois disso, a gente não dependia mais de energia elétrica. Nós fomos pro parque, nós fomos pra praia e voltamos a aceitar convites pra eventos sociais, pra show, pra estádio de futebol...
Eu contei essa história no Facebook e as minhas seguidoras apelidaram a mala de “mochila do amor”. Com aquela mala, nós podíamos fazer o que queríamos, o nosso problema estava bem resolvido, mas eu sabia que não éramos as únicas pessoas naquela situação. Tem no mínimo 300 mil pessoas eletrodependentes no Brasil. São adultos e crianças com ou sem deficiência presos a aparelhos. E pra cada uma dessas pessoas, existem famílias inteiras trancadas em casa, doentes e/ou deprimidas.
Um dos meus posts sobre isso na rede social viralizou, e uma agência de publicidade me convidou pra transformar a mochila em um produto. Eu chamei a médica que cuida do Léo e assim nasceu a Outcare, um projeto para incluir socialmente as pessoas eletrodependentes e seus cuidadores. A gente passou um ano testando o protótipo da Outcare. A gente tomou chuva, sol, foi pra praia e até fizemos uma viagem de motorhome nos Estados Unidos.
Em dezembro de 2023, 50 famílias receberam uma mochila, doadas pelo Hospital Samaritano. O hospital tá acompanhando essas crianças em um estudo clínico pra ver e avaliar o impacto na qualidade de vida antes e depois da Outcare. O nosso projeto está só começando e a gente já ganhou 20 prêmios internacionais. Em 2024, nós fomos o único case brasileiro entre os finalistas do Festival de Publicidade de Cannes, na categoria farmacêutica.
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O meu objetivo é que mais empresas abracem essa ideia e que a OutCare chegue também ao SUS, pra que todas as famílias com pessoas eletrodependentes, com ou sem dinheiro, possam conquistar autonomia e a liberdade, e voltar a sorrir. Assim como a minha.
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Geyze Diniz: Nossas histórias não acabam por aqui. Confira mais dos nossos conteúdos em plenae.com e em nosso perfil no Instagram @portalplenae.
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Para Inspirar
Na quinta temporada do Podcast Plenae - Histórias para Refletir, Fernanda Lima conta como encontrou-se depois de tanto procurar-se
11 de Julho de 2021
Leia a transcrição completa do episódio abaixo:
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Fernanda Lima: Meus pais são educadores físicos e me incentivaram a mexer com o corpo desde que eu me conheço por gente. Eu experimentei um monte de modalidades, sem me especializar em nenhuma. Joguei no time de vôlei da escola, fiz ginástica olímpica, ginástica rítmica, natação, patinação, futebol, handebol, balé, surfe… Passei a infância e a adolescência pulando de galho em galho. Mas eu já era adulta quando conheci a atividade que transformou mais do que meu corpo, a minha mente: a yoga.
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Geyze Diniz: Famosa apresentadora de TV, bonita por natureza e capa de revista desde os seus 14 anos, Fernanda Lima descobriu o sucesso quando ainda era uma menina. Mas foi ao amadurecer que conseguiu encontrar a real beleza da sua felicidade, através da yoga.
Conheça a história de autoconhecimento, resiliência e, acima de tudo, conexão entre corpo e mente, de Fernanda Lima. Ouça, no final do episódio, as reflexões do rabino Michel Schlesinger para te ajudar a se conectar com a história e com você mesmo. Eu sou Geyze Diniz e esse é o Podcast Plenae. Ouça e reconecte-se.
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Fernanda Lima: No começo da década de 90, todas as meninas queriam ser modelo. Eu não. Aos 14 anos, eu era BEM moleca, não gostava de me arrumar e me achava assim um pouco sem graça fisicamente. Eu me via como uma adolescente qualquer, de cabelo e olho castanho e rosto comum. Mas eu tinha uma vizinha, em Porto Alegre, que queria participar de um concurso de modelo. Ela, sim, levava jeito. Ela parecia a Barbie. Pra mim, já era a vencedora. Então eu fui com ela ao shopping, pra fazer a inscrição no concurso. Mas quando a gente chegou lá, perguntaram se EU não ia me inscrever também. Eu falei: “Não, de jeito nenhum, só vim acompanhar a minha amiga”.
Mas eles insistiram. Disseram que eu tinha tudo a ver com a moda, para eu chamar meu pai pra ele me autorizar a participar do concurso, já que eu era menor de idade. Eu achei aquilo tudo uma loucura, mas acabei voltando lá com o meu pai e eles convenceram o meu pai de que eu tinha potencial e assim eu fui inscrita.
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Embora eu morasse numa capital, eu me sentia um bicho do mato naquele universo das modelos. Eu olhava pras outras candidatas e pensava: “Eu sou a mais nada a ver”. As meninas eram muito magras, muito altas, tinham olhos azuis, cabelos compridos, vestiam roupas super da moda. Eu achava que elas olhavam pra mim e não entendiam o que tava fazendo lá. E acabou que eu ganhei a seletiva em Porto Alegre e cheguei na final, em São Paulo. O meu prêmio foi sair na capa da revista Capricho.
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As coisas na vida acontecem de um jeito que a gente nem sempre entende. A carreira de modelo praticamente caiu no meu colo. Embora não fosse o meu sonho, eu até que gostei da ideia de viajar, conhecer o mundo, falar outras línguas e ainda ganhar um dinheiro. Acima de tudo, gostei muito da ideia de ter liberdade. Então, decidi apostar na carreira e, um pouco contra a vontade dos meus pais, comecei a passar umas temporadas em São Paulo, na casa dos meus tios.
Os trabalhos foram aparecendo e eu fui trabalhando. Me desgarrei um pouco mais da minha família e fui morar um tempo no Japão e em Milão. Mas não foi exatamente uma história de conto de fadas e glamour. No fundo, eu me sentia um objeto como modelo.
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Eu comecei a me encontrar profissionalmente quando a MTV me convidou pra apresentar um programa chamado Mochilão. [trilha sonora]
Eu participei de uma temporada gravada no Havaí e adorei! Eu senti que o mundo da comunicação tinha muito mais a ver comigo. Eu também fui chamada para fazer um programa ao vivo na Rede TV. Foi uma baita oportunidade profissional. Nesse meio tempo também comecei a fazer faculdade de jornalismo. Eu tinha 22 anos e esse também foi o início da minha crise existencial.
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Junto com a visibilidade na TV veio o julgamento alheio. Diziam que eu não era boa o suficiente, que eu precisava me esforçar mais, que o meu sotaque me atrapalhava. Aquilo começou a me assustar. Ao mesmo tempo, tinha muita gente que começou a se aproximar de mim só porque eu fiquei conhecida. Eu fui me tornando uma pessoa BASTANTE desconfiada. Quando as câmeras desligavam, eu ia pra casa e eu me sentia extremamente sozinha. Eu descobri que existia um vazio na fama. E aquelas descobertas me despertaram para uma batalha interna. De repente, eu tinha sucesso, eu dinheiro, eu tinha homens interessantes, mas eu não estava feliz.
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Esse clique me veio no carnaval de 2001. Eu tinha convites pra ir pra Angra dos Reis, pra Campos do Jordão, pro Uruguai, pro Rio de Janeiro, pra festas, camarotes, shows… Mas no fundo, no fundo, eu não queria fazer nada daquilo. Eu não queria estar com nenhuma das pessoas que me convidaram pra passear. Eu queria era ficar sozinha, em silêncio. E eu não entendia por que eu não tinha vontade de participar daquele mundo de badalação. Afinal, quantas meninas não gostariam de estar no meu lugar?
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E foi no meio dessa crise que eu conheci a yoga.
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Por indicação de uma amiga, eu experimentei uma aula de ashtanga, um tipo de yoga bem exigente. Eu tenho um bom preparo físico, mas eu saí dessa aula suada da cabeça aos pés. Foi 1 hora e meia de uma prática dinâmica, com bastante alongamento, muita torção e uma respiração intensa. Eu senti como se tivesse entrado numa espécie de transe. Eu lembro que eu saí da aula à noite. Estava chovendo muito em São Paulo. Eu entrei no carro em êxtase, com uma sensação de felicidade que eu não consigo descrever. Eu dormi o melhor sono da minha vida nessa noite. Na manhã seguinte, acordei me sentindo plena. Peguei um chá, sentei no quintal, fiquei olhando pro sol e pras plantas e pensei comigo mesma: “Tá tudo aqui dentro”. A solidão, o medo, a desconfiança de tudo e de todos tinha ido embora. A minha felicidade finalmente estava dentro de mim, e não fora.
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Assim, decidi recusar todos os convites pras viagens do carnaval. Segui a minha intuição e fui passar 10 dias num retiro de silêncio na Serra da Cantareira, em São Paulo. A gente dormia às 9 da noite e acordava às 4 da manhã. Praticava yoga, meditava e seguia uma dieta vegetariana.
A parte mais difícil era não poder fazer contato visual com ninguém. Eu não entendi essa restrição, no início. Conforme eu fui vivendo a experiência, compreendi que o olhar, o diálogo e a cumplicidade também são ferramentas pra gente se sentir amada e aceita. Sem o contato visual, eu era obrigada a olhar pra mim e esquecer a aprovação alheia.
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Eu entendi que Natal, réveillon e carnaval são só recortes culturais do tempo. Eu não precisava estar em lugares especiais com pessoas diferentes pra me sentir bem. Eu podia ficar em paz sozinha, na minha casa, numa boa. Foi crucial eu ter feito essas descobertas naquele momento em que eu podia ter me deslumbrado com a fama. Eu lembro que meu pai sempre me dizia: “Mantenha os pés no chão, minha filha”. E o conselho dele fazia todo sentido. Com a yoga, eu sinto que eu plantei uma raiz. Criei uma solidez que me acompanha até hoje e que é cultivada todos os dias.
Me aprofundei na prática dos asanas, que é o nome das posturas, e deixei de comer carne. Aceitei que eu não preciso beber socialmente só pra me sentir inserida no grupo, já que eu não gosto assim de álcool. Passei a acreditar no meu poder interno e na minha sensibilidade. Eu tomei decisões sérias que contrariavam opiniões ao meu redor. Foi assim que eu pedi demissão da MTV, por exemplo. Eu estava no meu melhor momento na emissora, mas eu sentia que não tinha mais o que fazer lá dentro. Dali pra frente, eu só ia me repetir. E mesmo sem ter nenhuma proposta de trabalho, eu quis sair. Fiz um sabático e depois me mudei pro Rio pra ir ao encontro do meu namorado, que é hoje meu atual marido. E um tempo depois eu fui contratada pela Globo.
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Desde então, a yoga e a meditação são meus pontos de equilíbrio. Quando eu me sinto assim fora da casinha, eu pego o meu tapete e tchau. A prática me tira do externo e traz pra dentro. A yoga vira um estado de espírito, porque não tem como eu fazer os asanas, as posturas, uma hora e depois sair gritando com os meus filhos. É incompatível. No momento em que você começa a praticar, automaticamente você vai se conhecer, ter mais controle sobre as suas respostas emocionais e mais clareza sobre as escolhas na vida.
Com o tempo virou uma prática familiar. Quando eu conheci o Rodrigo, meu marido, ele não gostava de yoga, mas com a nossa convivência ele começou a praticar também. Hoje, ele é tão viciado quanto eu e sabe exatamente quando precisa ir pra salinha fazer umas posturas.
E a gente também transmite os ensinamentos pros nossos filhos. Quando eu sinto uma energia ruim entre as crianças, eu obrigo elas a sentarem no chão e respirarem comigo. Eles não entendem muito bem o exercício, mas eu faço isso pra plantar uma sementinha. Um dia, quando eles precisarem, e com certeza eles vão precisar em muitos momentos, eles podem usar esse recurso. Eu sempre falo pra eles: “Quando tudo mais falhar, respira e entra em contato com você”.
[trilha sonora] Eu também tento passar esse conhecimento pelo meu Instagram. Como o ashtanga é difícil pra quem não tem hábitos corporais, eu resolvi postar vídeos ajudando as pessoas a fazerem exercícios de respiração. Afinal, é um recurso que todo mundo tem e, se for bem utilizado, faz muito bem pra nossa saúde física e mental. O nosso modo de viver com a cabeça enlouquecida, buscando recompensa no prazer material e no consumo, é um caminho que , no fim, não traz nenhuma paz interna e que tá levando o planeta à destruição. A gente PRECISA parar pra refletir sobre isso. O autoconhecimento é o caminho pras pessoas entrarem em contato consigo mesmas e descobrirem que a plenitude e a felicidade na verdade tão dentro, e não fora da gente. [trilha sonora] Miguel Schlesinger: A sociedade de aparências sempre existiu. Antigamente, as pessoas deviam colocar as melhores joias, roupas e perucas, para se exibir na corte do rei. Quem olhava de fora, provavelmente achava que os membros da nobreza eram felizes. Mal sabiam o que acontecia na vida privada de cada um deles. Essa dinâmica está ainda mais potente hoje, por conta das redes sociais, mas a verdade é que ninguém é feliz pelo o que tem ou aparenta ser, e sim pelo que é. A Fernanda Lima só encontrou a felicidade quando olhou para dentro de si mesma. O veículo dela foi a yoga, mas outras pessoas podem trilhar este caminho pela arte, pela religião, pela terapia, por exemplo. O que eu não recomendo é ficar na superficialidade. Quando Moisés sobe ao Monte Sinai para receber os 10 mandamentos, Deus diz para ele: “Vá até o topo da montanha e esteja lá”. Dessa passagem bíblica a gente aprende que é possível ir até o topo da montanha e não se estar lá. Estar lá significa olhar para dentro e buscar a plenitude que existe no interior de cada um de nós. [trilha sonora] Geyze Diniz: Nossas histórias não acabam por aqui. Confira mais dos nossos conteúdos em plenae.com e em nosso perfil no Instagram @portalplenae. [trilha sonora]
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